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Em busca da revolução na saúde, inteligência artificial e união de dados são aposta de pesquisador

Economista, doutor em Saúde Pública e com pós-doutorado pela Universidade Harvard, Alexandre Chiavegatto Filho é professor livre-docente na USP

29 out 2022 - 05h10
(atualizado às 08h51)
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A importância dos dados para a pandemia foi imensurável. Na prática, foi a primeira crise sanitária orientada pela ciência de dados, área que transformará a saúde na próxima década devido aos avanços em inteligência artificial. A previsão é de Alexandre Chiavegatto Filho, professor de aprendizagem de máquinas em saúde na Universidade de São Paulo (USP) e diretor do Laboratório de Big Data e Análise Preditiva em Saúde (Labdaps) da mesma instituição.

No dia a dia, algoritmos são capazes de recomendar possíveis amigos em redes sociais e indicar vídeos no YouTube. Em essência, é um conjunto de instruções programadas para orientar um sistema a realizar uma tarefa, o que pode ser aperfeiçoado a partir da geração de novos dados. No contexto da saúde, eles tomam decisões inteligentes para melhorar a eficiência de atendimentos, agilizando o tempo numa fila de espera ou mesmo reservando leitos hospitalares. Em um futuro próximo, a grande conquista seria que os algoritmos contribuíssem de forma extensiva para a prática clínica de profissionais da saúde, a ponto de predizer riscos de doenças e melhorar a qualidade de vida das pessoas.

O Brasil é referência na coleta de algumas informações e os algoritmos estão disponíveis online por linguagem de programação, mas, segundo Chiavegatto, ainda é preciso avançar em questões importantes. Por exemplo, na união de bancos de dados a nível nacional e na formação e retenção de profissionais qualificados na área da saúde. Em conversa com o Estadão, por ocasião do Summit Saúde & Bem-estar 2022, ele lista as oportunidades e os principais desafios de sua área de atuação.

Qual é a grande vertente de pesquisa na qual o Labdaps da USP está trabalhando?

Tentar descobrir se os algoritmos de inteligência artificial em saúde são transferíveis entre diferentes hospitais e regiões brasileiras. Será que um algoritmo que é desenvolvido com os dados de pacientes de São Paulo funciona para outras localidades? Temos resultados preliminares de pesquisas que indicam que não. Esse é o maior desafio, porque, se eles não forem transferíveis, cada instância de saúde precisará desenvolver algoritmos para a realidade de seus próprios pacientes. Então, a pergunta é como otimizar esses algoritmos dada a complexidade do Brasil. Temos diversidade socioeconômica, genética, em protocolos de atendimento e no acesso a serviços.

Já existe alguma hipótese de como esse problema pode ser solucionado?

Uma possibilidade é treinar o algoritmo com dados de um hospital específico. A principal estratégia que estamos desenvolvendo é trazer algoritmos que aprendem o básico da situação de saúde em localidades onde há mais dados disponíveis. Aprender o básico significa, por exemplo, identificar problemas gerais de saúde e associar fatores de risco para doenças graves em grupos da população. Há muitas clínicas pequenas no Brasil sem volume de dados suficiente para fazer esse treinamento. Chamamos isso de inteligência artificial de transferência, quando há um aprendizado inicial dos algoritmos em regiões com mais dados e, depois, eles aprendem as nuances dos pacientes das regiões com um volume menor de informações.

Você poderia dar um exemplo de como o algoritmo pode ajudar a prática clínica?

Vamos lá: algoritmos que predizem o risco de enfarte. No entanto, a decisão tomada pelo algoritmo em cidades remotas será diferente daquela nos grandes centros urbanos, porque as variáveis e condições de saúde mudam.

Qual é o grande custo da área de inteligência artificial hoje em dia?

Ter o profissional capacitado para desenvolver algoritmos que funcionem da melhor forma possível. O sistema de saúde compete com o sistema financeiro, uma área mais capitalizada e que paga melhor esse tipo de profissional. Hospitais maiores e com mais verba conseguem sair à frente para lidar com essa situação.

Então, é possível pensar que os hospitais e serviços públicos ficariam por último nessa disputa?

Isso acontece na prática. A primeira área a abrir muitas vagas para profissionais e a conseguir preenchê-las foi o sistema financeiro. Houve um movimento muito grande de abertura de vagas desde 2018. À medida que novos profissionais vão se formando, a oferta de trabalho também cresce. No setor da saúde, os hospitais privados têm mais recursos disponíveis para esse tipo de investimento, mas os hospitais públicos também conseguirão, eventualmente, começar a compor suas próprias equipes de ciência de dados.

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  • O sistema de saúde brasileiro é referência em algumas coletas de informação. O que já fazemos bem?

    Nossa coleta de dados é referência internacional em algumas áreas. Por exemplo, o Brasil coleta mais de 95% dos dados de nascimento e óbito que ocorrem em todo o território nacional, com riqueza de informações. Nos dados de nascimento, há detalhes sobre idade gestacional, escolaridade da mãe e outros itens importantes para termos uma ideia da situação de saúde. Nos dados de óbitos, coletamos a causa, se há doença relacionada à morte, sexo e assim vai. Isso não é comum para um país tão grande e diverso. Qual é o problema? São bancos de dados independentes um do outro, não conseguimos relacionar essas pessoas que nascem e que morrem. O mesmo acontece para atendimentos ambulatoriais e hospitalares no SUS, que coleta esses dados, mas as informações não dialogam. Não conhecemos a trajetória do paciente, que passa por diferentes serviços de saúde ao longo da vida.

    Considerando isso, em que precisamos melhorar?O que gostaríamos é do acompanhamento do paciente para desenvolver algoritmos que indiquem riscos relacionados à saúde. Melhor que isso seria ter um prontuário eletrônico unificado, com dados dos sistemas público e privado disponíveis para a pesquisa científica. Por exemplo, resultados de exames, avaliações clínicas e acesso a serviços. Isso teria um excelente custo-benefício e poderia melhorar a eficiência do sistema como um todo, evitando que exames desnecessários sejam realizados.

    Estadão
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