Gás lacrimogêneo pode matar em ambiente fechado; conheça efeitos
Especialistas falam sobre consequências de gás lacrimogêneo e spray de pimenta e explicam eficácia do vinagre
A quarta manifestação do Movimento Passe Livre na última quinta-feira (13) contra o aumento da tarifa do transporte público em São Paulo foi marcada por violência, tiros de bala de borracha, uso de gás lacrimogêneo e spray de pimenta. Manifestantes e pessoas que estavam nos arredores da rua da Consolação e avenida Paulista reclamaram de irritação nos olhos, garganta e falta de ar. Para o quinto protesto, marcado para esta segunda-feira (17), a polícia descartou o uso de balas de borracha, mas não de spray de pimenta e gás lacrimogêneo. Apesar de classificado como substância não letal, segundo o coordenador do Centro de Controle de Intoxicações da Unicamp, Eduardo de Capitani, o gás lacrimogêneo pode causar complicações e até matar se for aplicado em ambiente fechado.
“É uma substância que pode matar e, em ambiente fechado, mata mesmo. É classificada como não letal, mas não significa que não tenha toxicidade para matar" , disse Capitani. "Ao ar livre o efeito tóxico é limitado, ele se dispersa e as pessoas tendem a fugir”, esclarece o especialista. Há cerca de 15 anos, Capitani recebeu vários pacientes em estado grave após um policial usar o gás dentro de um presídio. “Vários morreram”, lembrou ele.
Em ambientes arejados, quem pode sofrer com o gás lacrimogêneo são as pessoas que já têm problemas pulmonares – como asma e bronquite - ou cardíacos. “O gás pode desencadear uma crise e a pessoa passar muito mal”, disse Capitani. A reação do organismo quando entra em contato com o gás é de defesa: “acontece um bronquioespasmo, uma diminuição da oxigenação. O pulmão tenta se defender da substância, diminuindo a quantidade de ar que entra e, para quem não está com o pulmão completamente bom, pode haver consequências mais graves”.
O uso das substâncias nas ruas, por exemplo, serve para controle de distúrbios já que causam irritação nas mucosas, afirmou Capitani. “Pode dar tosse e falta de ar. Mas os efeitos se resolvem em pouco tempo, desde que esteja em campo aberto, ao ar livre”, reforçou. Os olhos costumam ser a região mais afetada, ficam vermelhos, com ardência e lacrimejando, segundo o oftalmologista do Instituto Penido Burnier, Leôncio Queiroz Neto. “O efeito costuma durar 1 hora ou mais”, estimou.
O médico alertou para os riscos de contaminação para pessoas que usam lente de contato e óculos. Segundo ele, a substância pode ficar “impregnada” e aumentar o tempo de contato tóxico. “Vi que alguns jovens enrolaram um pano na cabeça no último protesto, mas, com o gás, o tecido fica contaminado, fica evaporando a substância e piora a irritação”, afirmou. O ideal é usar óculos de natação e bandanas, desde que trocadas a cada contato com o gás ou spray de pimenta, aconselhou.
O gás
“Geralmente é composto por dibenzoxazepine e cloroacetofenona. Alguns têm o clorobenzilideno também”, especificou Neto. Capitani explicou que são moléculas complexas com cloro e que suas substâncias podem variar. O contato com o gás costuma irritar as mucosas dos olhos, boca e nariz, segundo o oftalmologista. A única forma de fugir dos sintomas é evitar a inalação, disse Capitani.
Vinagre
O toxicologista disse desconhecer estudos que comprovem a eficiência do vinagre para amenizar os sintomas. Ele afirmou, porém, que o vinagre já foi utilizado para tratar pessoas com ardência na pele por causa da capsaicina, substância derivada da pimenta vermelha e usada no spray de pimenta. “Não tem nenhum trabalho que considere o uso de vinagre contra gás. Para gás lacrimogêneo, eu nunca vi nada para amenizar os sintomas”, disse o toxicologista.