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Imunidade de rebanho é temporária, dizem especialistas

'Pessoas imunes em alguns locais protegem outras que são suscetíveis a se infectar. Se voltar à vida da pré-pandemia, essas bolhas vão explodir', explica professor

23 set 2020 - 11h02
(atualizado às 11h18)
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A discussão sobre uma possível imunidade de rebanho voltou a ganhar força após a divulgação de um estudo da Universidade de São Paulo (USP) sobre a redução nos casos da covid-19 em Manaus, atribuída à possibilidade de 2/3 da população ter sido infectada ao longo da pandemia. O tema ainda é visto com ressalvas por especialistas ouvidos pelo Estadão. Eles destacaram que o fenômeno tem efeitos temporários e que ainda não há conclusões se ele ocorre no Brasil.

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Foto: ANSA / Ansa

Médico da Clínica de Epidemiologia do Hospital Universitário da USP, Marcio Sommer Bittencourt afirma que estudos apontam que a imunidade adquirida por aqueles que tiveram o novo coronavírus é temporária. Portanto, uma grande quantidade de pessoas ter contraído a doença não significa que não irão contraí-la novamente, ainda mais se isso for associado aos indícios de que o novo coronavírus é sazonal e se dissemina principalmente nos períodos análogos ao inverno.

Segundo Bittencourt, também não há uma unanimidade sobre qual seria um percentual de cobertura para se entender uma imunidade de rebanho, mesmo que temporária. "Pode ser que seja quando chegar aos 60%, aos 70%", comenta. "Isso não quer dizer que as pessoas não vão mais pegar, que todo mundo está protegido, mas que seria uma coisa mais pequena, surtos mais localizados."

Destaque semelhante é feito pelo médico Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), que aponta a questão da imunidade como "uma das maiores lacunas de conhecimento sobre a covid". Um dos aspectos que dificulta essa mensuração de quem está imune é que as pessoas que tiveram a doença de forma mais leve ou que sequer tiveram sintomas identificados tendem a desenvolver menos anticorpos (embora adquiram resistência celular).

Além disso, a depender da gravidade do quadro, esses pacientes menos graves perdem esses anticorpos mais rapidamente. "Pode ser que daqui a 3 ou 4 meses, 30%, 40% não tenha mais anticorpo (para a covid-19)", pontua. Ele ainda reitera que há variação na confiabilidade dos testes, que podem apresentar maior ou menor número de resultados falsos, a depender do kit que é utilizado.

Kfouri explica que capitais que tiveram uma massa muito grande de infectados, como Nova York, tendem a apresentar uma menor circulação do vírus hoje. "Provavelmente ali, houve um esgotamento de pessoas suscetíveis (à doença, por uma parcela grande ter tido contato), mas cada local tem suas peculiaridades", explica. No contexto brasileiro, por exemplo, cidades que tiveram picos rápidos e acentuados, como Belém e Manaus, teriam mais chance de passar por essa situação (mesmo que momentaneamente).

Já o professor da UFABC, José Paulo Guedes Pinto, do grupo de pesquisa Ação Covid-19, destaca ainda que a maioria dessas "bolhas" de imunidade são muito frágeis e dependem das características de cada região, como densidade, classe social e acesso à saúde, dentre outras.

"As pessoas imunes em alguns locais 'protegem' as outras que são suscetíveis a se infectar. Se voltar à vida da pré-pandemia, essas bolhas vão explodir", comenta. Ele cita como exemplo o Estado de São Paulo, que teve aumento na média móvel de mortes nesta semana, após o feriado de 7 de Setembro apresentar aglomerações no litoral.

Outro elemento que contribui para a formação dessas bolhas de proteção é que, por mais que tenha ocorrido um afrouxamento nas medidas de prevenção, ainda há uma parcela significativa da população que utiliza máscara, faz distanciamento social e pratica outros cuidados para evitar a transmissão.

"Isso também esgota as redes de contágio", comenta. "Agora, a imunidade coletiva, de rebanho, só faz sentido com uma vacinação. A única saída é não pegar o vírus, porque pouquíssimos pegaram (em comparação ao total da população)."

Estadão
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