'Meu pai faleceu em casa. Foi o melhor para ele e para nós'
No Dia Mundial dos Cuidados Paliativos, Paula conta como foram os últimos dias do seu pai após o diagnóstico de um câncer agressivo
Hoje, 12 de outubro, é o Dia Mundial dos Cuidados Paliativos. Em um depoimento emocionante, a assessora de imprensa Paula Milagres relata à repórter Erem Carla como foram os últimos dias em cuidados paliativos do seu pai, Paulo, que faleceu de mãos dadas com ela, ao lado da sua mãe, Conceição, e da sua irmã, Lívia.
"Meu pai foi diagnosticado com um lipossarcoma na região abdominal em abril de 2019, aos 66 anos. Desde o primeiro momento, o médico esclareceu que se tratava de um câncer não passível de tratamento convencional. Sempre que reaparecesse, uma cirurgia seria necessária. Assim foi.
Ele foi submetido a duas cirurgias em 2019, uma em 2020, e outra em 2021. Na última cirurgia, devido ao seu estado de saúde já bastante debilitado, foi indicado que ele iniciasse os cuidados paliativos, que duraram dois meses.
Minha família e eu não ficamos surpresos, os médicos sempre foram muito claros conosco em relação ao estado de saúde dele, ao diagnóstico e às escassas opções de tratamento. Compreendemos que os cuidados paliativos seriam essenciais para proporcionar-lhe mais qualidade de vida, apesar do prognóstico desfavorável.
Não tivemos preocupações nem medos.
Meu pai estava ciente de sua condição e do seu real estado de saúde. A perspectiva de receber atenção especializada em casa trouxe mais segurança para ele, sabendo que estava sendo constantemente atendido por uma equipe de médicos, nutricionista, enfermeiro, psicólogo e fisioterapeuta. Isso também nos tranquilizou, pois estivemos ao seu lado durante todo o período da doença.
Tudo foi compartilhado com ele e com nossa família. Os cuidados paliativos focam na atenção individualizada. Houve dias em que o fisioterapeuta chegava e meu pai não tinha ânimo para se exercitar. Nessas ocasiões, a sessão se transformava em uma conversa amigável, sempre conduzida com muito cuidado e carinho para que ele se sentisse acolhido, mesmo em um momento de saúde irreversível.
Durante a pandemia, já havíamos adaptado toda a rotina doméstica para acomodá-lo. Inicialmente, ele estava bem, mas após a cirurgia de 2020, sua locomoção ficou comprometida e ele usou um andador por alguns meses. A alimentação também foi adaptada devido à radioterapia, para evitar mal-estar. Fizemos de tudo para aliviar seu desconforto.
Após a operação de 2021, que resultou na necessidade de cuidados paliativos, já tínhamos uma rotina estabelecida em casa. A família cuidava dele, e após a cirurgia, contamos com o apoio de uma equipe de cuidados paliativos, incluindo médicos, fisioterapeutas, nutricionistas, enfermeiras, psicólogos e geriatras.
Os profissionais sempre falavam docemente, atendiam prontamente a qualquer desconforto físico ou psicológico dele, mostrando-se disponíveis para assisti-lo da melhor forma possível, ajustando seus horários em momentos delicados. Isso fez com que ele se sentisse profundamente amado.
Ele sabia que estávamos ali e permanecemos ao seu lado até o final.
No mês em que ele faleceu, ele já estava mais cansado, não conseguia mais se alimentar como antes e nós já sabíamos, inclusive por conta da conversa com os especialistas, que o momento dele chegaria em breve. Mas percebemos que o fim da vida dele estava próximo, principalmente nos últimos 10 dias, marcados por crises de pânico, uma perda de apetite cada vez maior e mais dificuldade para respirar.
Meu pai faleceu em casa. Optamos por trazer um respirador, ter ao nosso lado técnicas de enfermagem e médicos para monitorar o estado de saúde dele em casa. Ele parou de comer totalmente um dia antes de falecer. Durante todo o tempo, foi medicado para não sentir nenhum tipo de dor ou incômodo. Sabíamos que o momento estava chegando.
Fizemos o que estava em nossas mãos, tanto em termos profissionais quanto emocionais. Apesar da morte ser um processo doloroso, sabíamos que isso traria alívio para o que ele estava sentindo. Embora ele não estivesse totalmente consciente, sabia que estávamos ali e permanecemos ao seu lado até o final.
A expressão 'na saúde e na doença' é muito forte. Estar ao lado de quem se ama no momento da dor é fundamental e a maior demonstração de cuidado que se pode dar. Tivemos a indicação de um médico externo para que ele fosse para o hospital, mas após conversarmos com a equipe de home care sobre o ocorrido, eles concordaram com nossa decisão de que em casa ele teria a assistência suficiente e a família reunida em todo o tempo, até o final.
Ele faleceu de mãos dadas comigo, com minha mãe e minha irmã. Foi o melhor para ele e para nós.
O mais importante foi ele ter recebido cuidados de forma plena, sem sair do conforto de casa, no tempo dele e com toda a atenção. Contávamos com uma equipe totalmente preparada para lidar com esse tipo de situação. Foi algo realmente emocionante. Isso impactou a forma como meu pai viveu os últimos dias por saber que estava sendo assistido 100% do tempo. Por mais que a morte seja um mistério para quem está partindo, ele se sentiu amparado durante todo o processo.
A família ama, mas não tem o conhecimento necessário para prestar os cuidados, a atenção e melhorar a qualidade de vida do paciente da maneira que os profissionais de atenção paliativa têm. Se puder, opte por isso. É mais uma forma de demonstrar amor ao doente e uma maneira dele perceber que não precisa ter medo, pois está sendo cuidado da melhor forma possível."