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Nas lojas de Feira de Santana, as máscaras contra o coronavírus mais assustam do que protegem

Cidade baiana confirmou dois casos da doença e viu mudança na rotina. Comerciantes temem efeitos sobre a economia local

11 mar 2020 - 06h10
(atualizado às 13h31)
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FEIRA DE SANTANA, BAHIA - Desde a confirmação do primeiro caso de coronavírus (Covid-19) em Feira de Santana, distante cerca de 115 km de Salvador, na sexta-feira, 6, a rotina da cidade comercial vem mudando. Enquanto a população já encontra dificuldade em comprar álcool em gel e máscaras, entre alguns comerciantes a preocupação é com a economia.

Pelas ruas do centro ainda é raro ver transeuntes usando máscaras, mas basta olhar com atenção para dentro de algumas lojas da Rua Conselheiro Franco para encontrar vendedores usando o item de proteção. O que esses estabelecimentos comerciais têm em comum: pertencem a chineses e possuem avisos nas paredes sobre o porquê do acessório. "Estamos de máscara só por proteção", explicam os papéis com tradução em inglês e mandarim.

Embora haja uma clara intenção em explicar o motivo do uso de máscaras, às vezes os avisos não chegam sequer a ser lidos. Gerente de uma loja de variedades — de guarda-chuva a eletrônicos -, Fabrício Amorim diz que o uso das máscaras tem diminuído o fluxo de clientes. "Algumas pessoas sequer entram. Olham da porta, demonstram receio quando nos veem usando e seguem", disse.

Thainá Araújo, vendedora de uma loja de bolsas, também relata a desconfiança de alguns clientes. "Nesta semana, uma mulher estava pesquisando preços e se afastou com medo quando me viu de máscara. Quando perguntei o motivo, ela me questionou se eu tinha coronavírus", lembrou.

Para evitar comentários e olhares semelhantes, além de aguentar o calor feirense, Thainá e Fabrício decidiram abandonar a recomendação dos chefes e seguem usando apenas o álcool em gel. Há lojas, porém, em que o funcionário não tem escolha. "Eu posso perder dinheiro, mas não posso perder a minha saúde. Quem não quiser usar que fique em casa", indicou incisivamente a proprietária de uma outra loja.

Além da obrigatoriedade das máscaras, ela (que preferiu não se identificar) recomenda que os funcionários não usem transporte público para chegar ao trabalho. "Preferia que viessem andando ou de bicicleta".

Segundo a médica infectologista Melissa Falcão, coordenadora do Comitê Gestor Municipal de Controle ao Coronavírus, não existe nenhuma indicação de uso de máscaras pela população em geral. "A máscara só é recomendada para profissionais de saúde que tiverem atendendo pessoas com suspeita do coronavírus ou para aqueles que têm queixas respiratórias", explicou. Melissa indicou que o uso da máscara só seja feito em caso de epidemia, como aconteceu na China, por medida de contenção do vírus.

O Ministério da Saúde orienta que cuidados básicos devem ser tomados para reduzir o risco de contrair ou transmitir infecções respiratórias agudas como o coronavírus — a máscara não está na lista. As principais orientações são: lavar as mãos frequentemente com água e sabão; higienizar as mãos com desinfetante à base de álcool, quando não puder lavá-las; evitar tocar nos olhos, nariz e boca com as mãos sujas e cobrir com um lenço de papel a boca e nariz quando for espirrar, descartando o lenço em seguida.

Impacto na economia

Entre os brasileiros que possuem comércio na cidade, a preocupação está mais associada à economia — principalmente para aqueles que trabalham com produtos eletrônicos. Leshlen Coelho, de 26 anos, gerente geral de uma distribuidora de acessórios para smartphones, afirma que a redução no fornecimento de produtos vindos da China terá impacto no bolso do consumidor final. Com o estoque reduzido e com a incerteza de quando a situação será normalizada, a solução encontrada por ele foi anunciar o aumento do preço da venda. "A partir da próxima segunda, 16, os produtos devem sofrer um aumento em torno de 15%. Isso devido ao coronavírus. Se o dólar se mantiver em alta, haverá novo aumento", esclareceu.

Para driblar o possível reajuste de preços, o revendedor Victor Santana, de 31, que atua na região de Amélia Rodrigues e Conceição do Jacuípe, viajou a Feira de Santana para aumentar o depósito. "Eu comprei em quantidade porque há uma redução da expectativa de produção no setor de eletrônicos no Brasil", justificou. Victor fez referência ao levantamento publicado pela Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) no fim de fevereiro. Segundo a Abinee, 57% das indústrias de eletrônicos entrevistadas já tiveram problemas para receber produtos vindos da China.

No Feiraguay, shopping popular com 490 boxes que abriga 700 comerciantes — sendo 23 chineses -, a preocupação também existe. De acordo com Sandro Santana, vice-presidente da Associação dos Vendedores Ambulantes de Feira de Santana (Avamfs), o coronavírus deve impactar diretamente a economia no local, que recebe em torno de 3 a 4 mil pessoas por dia. "Já existe um planejamento para que a partir da próxima segunda, 16, a gente comece a reajustar os preços. Quem vinha comprar dez, vai comprar cinco", lamentou.

Viabilização da micareta

A Micareta de Feira, prevista para o fim de abril, também não ficou de fora dos efeitos do coronavírus. O Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA) instaurou na última segunda-feira, 9, procedimento administrativo para averiguar a proliferação do vírus na cidade e a viabilidade da realização da festa sem que haja riscos para a população.

Em nota, o MP-BA afirma que as secretarias de Saúde da Bahia e de Feira de Santana devem encaminhar plano de contingência do coronavírus e parecer técnico sobre os riscos de proliferação no município e da disseminação na festa. Segundo o Comitê Gestor Municipal de Controle ao Coronavírus, a realidade epidemiológica atual não apresenta nenhum dado que indique a suspensão ou adiamento da Micareta.

Segundo o último boletim Situação Epidemiológica dos casos da Doença pelo Coronavírus (COVID-19), divulgado nesta terça-feira, 10, até o momento foram notificados 24 casos suspeitos de Coronavírus em Feira de Santana. Nove foram descartados, 01 caso foi excluído e 12 aguardam o resultado de exames laboratoriais.

Dois casos foram confirmados na semana passada. A primeira pessoa contaminada, uma mulher de 34 que havia viajado à Itália em fevereiro, sai hoje de quarentena domiciliar e já não apresenta mais risco de transmitir a doença. A segunda mulher, que teve contato com a pessoa do primeiro caso, sairá da quarentena ainda esta semana. Embora o Ministério da Saúde recomende sete dias de quarentena, ambas ficaram 14 dias por medida de precaução.

Estadão
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