OMS volta a considerar a mpox, antiga varíola dos macacos, uma emergência de saúde global
Decisão ocorre após surtos no Congo e em outras partes da África, com mais de 500 mortes; cientistas e autoridades se preocupam com nova forma do vírus que circula
Após surtos no Congo e outras partes da África, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou que a mpox, antigamente chamada de varíola dos macacos, como uma emergência de saúde global, com casos confirmados entre crianças e adultos em mais de uma dúzia de países. Além disso, há uma nova forma do vírus se espalhando. Poucas doses de vacinas estão disponíveis no continente africano.
No início desta semana, o Centro Africano para Controle e Prevenção de Doenças (Africa CDC) anunciou que os surtos de mpox eram uma emergência de saúde pública, com mais de 500 mortes, e pediu ajuda internacional para conter a propagação do vírus.
"Isso é algo que deve preocupar a todos. O potencial de disseminação na África e além dela é muito preocupante", disse o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus.
O Africa CDC já havia informado que o mpox, também conhecido como varíola dos macacos, foi detectado em 13 países neste ano, e que mais de 96% de todos os casos e mortes ocorreram no Congo. Os casos aumentaram 160% e as mortes subiram 19% em comparação com o mesmo período do ano passado. Até agora, foram mais de 14 mil casos e 524 mortes.
"Estamos agora em uma situação em que o mpox representa um risco para muitos vizinhos dentro e ao redor da África Central", disse Salim Abdool Karim, especialista sul-africano em doenças infecciosas e presidente do grupo de emergência do Africa CDC. Ele observou que a nova versão do mpox que se espalha a partir do Congo parece ter uma taxa de mortalidade de cerca de 3% a 4%.
Durante o surto global de mpox em 2022, que afetou mais de 70 países, menos de 1% das pessoas morreram.
Michael Marks, professor de medicina da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, disse que declarar os surtos de mpox na África como uma emergência é justificável se isso levar a mais apoio para contê-los. "É uma falha da comunidade global que as coisas precisaram chegar a esse ponto para liberar os recursos necessários", disse ele.
Autoridades do Africa CDC disseram que quase 70% dos casos no Congo são em crianças com menos de 15 anos, que também representaram 85% das mortes.
Jacques Alonda, epidemiologista que trabalha no Congo com organizações internacionais, disse que ele e outros especialistas estão particularmente preocupados com a disseminação do mpox em campos de refugiados no leste conflituoso do país.
"O pior caso que vi foi o de um bebê de seis semanas que tinha apenas duas semanas de vida quando contraiu mpox", disse Alonda, acrescentando que o bebê está sob seus cuidados há um mês. "Ele foi infectado porque a superlotação hospitalar fez com que ele e a mãe fossem forçados a compartilhar um quarto com outra pessoa que tinha o vírus, e que não havia sido diagnosticado."
A Save the Children, organização não governamental de defesa dos direitos da criança no mundo, disse que o sistema de saúde do Congo já estava "colapsando" sob a pressão da desnutrição, sarampo e cólera.
O diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, disse que as autoridades enfrentam vários surtos de mpox em diversos países, com "diferentes modos de transmissão e diferentes níveis de risco".
A agência de saúde da ONU informou que o mpox foi recentemente identificado pela primeira vez em quatro países da África Oriental: Burundi, Quênia, Ruanda e Uganda. Todos esses surtos estão ligados ao do Congo. Na Costa do Marfim e na África do Sul, as autoridades de saúde relataram surtos de uma versão diferente e menos perigosa do mpox que se espalhou mundialmente em 2022.
No início deste ano, cientistas relataram o surgimento de uma nova forma mais letal de mpox, com uma letalidade de até 10%, em uma cidade mineradora congolesa, temendo que pudesse se espalhar mais facilmente. O mpox se espalha principalmente através do contato próximo com pessoas infectadas, inclusive por meio de relações sexuais.
Ao contrário dos surtos anteriores de mpox, onde as lesões eram principalmente vistas no peito, mãos e pés, a nova forma causa sintomas mais leves e lesões nos genitais. Isso torna mais difícil de identificar, o que significa que as pessoas também podem infectar outras sem saber que estão doentes.
Em 2022, a OMS declarou o mpox como uma emergência global de saúde após se espalhar para mais de 70 países que não haviam relatado casos anteriormente, afetando principalmente homens gays e bissexuais. Antes desse surto, a doença havia sido vista principalmente em surtos esporádicos na África Central e Ocidental, quando as pessoas entravam em contato próximo com animais selvagens infectados.
Os países ocidentais conseguiram conter a disseminação do mpox com a ajuda de vacinas e tratamentos, mas muito poucas dessas opções estão disponíveis na África.
Marks, da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, disse que, na ausência de vacinas contra o mpox licenciadas no Ocidente, as autoridades poderiam considerar a vacinação contra a varíola, uma doença relacionada. "Precisamos de um grande suprimento de vacinas para que possamos vacinar as populações em risco", disse ele, acrescentando que isso incluiria trabalhadores do sexo, crianças e adultos que vivem em regiões de surto.
As autoridades congolesas disseram que pediram 4 milhões de doses da vacina contra o mpox, informou Cris Kacita Osako, coordenador do Comitê de Resposta à Varíola dos Macacos do Congo, à AP. Osako disse que essas doses seriam principalmente para crianças menores de 18 anos. "Os Estados Unidos e o Japão foram os dois países que se posicionaram para fornecer vacinas ao nosso país", disse Osako.
Embora a declaração de emergência da OMS tenha como objetivo impulsionar agências doadoras e países a agirem, a resposta global a designações de emergência anteriores foi mista.
A Boghuma Titanji, especialista em doenças infecciosas da Universidade de Emory, disse que a última declaração de emergência da OMS para o mpox "fez muito pouco para mover o ponteiro" em relação a obter coisas como testes diagnósticos, medicamentos e vacinas para a África.
"O mundo tem aqui uma oportunidade real de agir de forma decisiva e não repetir erros passados, (mas) isso exigirá mais do que uma declaração de emergência", disse Titanji./AP