Bassin de la Villette: conheça o bairro que virou moda em Paris
Antes marginalizado, local passou por revitalização e se transformou em mais um disputado ponto turístico da capital francesa
Paris é uma das cidades mais visitadas do mundo. Milhões de turistas passam pela capital anualmente. A lista de atrações da cidade, no entanto, é longa demais. A estadia média, de apenas 2,09 dias por visitante, não ajuda. É pouco tempo para subir a Torre Eiffel, ver a Monalisa no Louvre, passar sob o Arco do Triunfo e ainda comprar aquela lembrancinha para a cunhada nas Galeries Lafayette.
Mas se você está em Paris em um período de sol e calor e é daqueles turistas que andam pelo mundo sem a urgência de ver o tudo e o nada ao mesmo tempo, vale a pena passar uma tarde no Bassin de la Villete, o tradicional bairro do nordeste da capital que nos últimos cinco anos passou por um processo de renovação e hoje atrai moradores dos quatro cantos da cidade.
Até pouco tempo, um passeio pelo bairro não era algo a ser levado em consideração quando se planejava um fim de semana agradável. Abandonado à própria sorte durante anos, o Bassin de la Villette e seus arredores registravam elevadas taxas de criminalidade. Era um lugar sujo, decadente e perigoso. Muito longe do glamour parisiense vendido nos pacotes turísticos.
No fim do ano 2000, esse panorama começou a mudar. A prefeitura investiu no bairro, atraindo famílias, estudantes e jovens de classe média de volta ao Bassin. Os dois cinemas que compunham a oferta de lazer local ganharam a companhia de novos bares e restaurantes. A clientela mudou. A frequentação também. Saíram deprimentes rodas de viciados em crack, entraram animadas rodas de piquenique.
Chope na laje e Paris Plage
Um dos melhores exemplos dessa renovação é o bar e restaurante 25º Est, que tem a “laje” mais disputada de Paris. Se faz sol e calor na capital, o terraço com vista para o espelho d’água fica lotado. Dezenas de pessoas ocupam mesas e cadeiras bebendo, conversando e assistindo ao pôr-do-sol. Não raro, o happy hour é acompanhado de música ao vivo, tocada por artistas de rua.
Do terraço do 25º Est é possível avistar a Péniche Antipode, um barco transformado em bar de cervejas artesanais, sucos orgânicos e espetáculos de música e teatro. A embarcação fica atracada a maior parte do ano na margem do Quai de la Seine, só levantando âncora no final de julho, quando começa o Paris Plage.
Muita gente não sabe, mas a tradicional praia artificial dos parisienses não funciona apenas às margens do rio Sena. Durante o mês de agosto, ela também se instala no Bassin de la Villette. Nessa época, crianças e adultos aproveitam as atrações que vão de aulas de canoagem e corridas de kart a bailes populares e travessia do espelho d’água em tirolesa.
Renascimento
Jérôme Naccache não tem nada contra o Paris Plage, mas não gosta da maneira como ele foi concebido no Bassin de la Villette. “Para que fechar todo mundo em um cercadinho quando esse lugar é ideal exatamente por ser aberto e tranquilo?”, pergunta ele, enquanto aponta para a cerca que impede que os clientes de seu estabelecimento enxerguem o espelho d’água e a ponte levadiça da rue de Crimée, a única ainda em funcionamento na capital francesa.
Faz 12 anos que Jérôme apostou no Bassin de la Villette e abriu o BarOurcq, um bar com balcão de zinco, onde é servido um drinque à base de gengibre e especiarias, feito por uma velha senhora que emigrou do Mali e é vizinha do estabelecimento.
“Quando eu era criança, o Bassin de la Villette não era um lugar onde as pessoas vinham muito. Hoje é um lugar seguro e quem quer fazer algo diferente em Paris, vem para estes lados da cidade”, explica Jérôme.
Ao ser inaugurado, em 1808, para servir de reservatório de água potável para Paris e abastecer canais periféricos, o Bassin de la Villette era um passeio arborizado, onde casais apaixonados passeavam de mãos dadas. Décadas depois, a industrialização da capital transformou o local em um porto. Estivadores, gruas e depósitos tomaram conta das margens e passaram a compor a paisagem.
Veio a crise da indústria parisiense em meados do século passado e o tráfego fluvial tornou-se irrisório. A economia local foi afetada e afundou o Bassin de la Villette em um período sombrio de marginalização. Até a chegada dos novos moradores.
“Foi como um efeito ‘bola de neve’. As pessoas foram chegando umas depois das outras e ocupando o bairro”, conta Jérôme, que define sua clientela como sendo composta por hipsters, artistas, trabalhadores freelancers, desempregados e os chamados bobos (pronuncia-se bobôs), como são conhecidos os burgueses boêmios que estão transformando bairros antes degradados da capital em novos locais da moda.
Pressão imobiliária
A chegada desta nova classe média está diretamente ligada à pressão do mercado imobiliário parisiense, que tem empurrado parte da população para bairros mais afastados do centro. É o fenômeno é conhecido como boboïsation, um neologismo para explicar que um lugar foi tomado por bobos.
Com preços muito mais competitivos, o Bassin de la Villette atrai quem prefere pagar o mesmo preço por mais espaço. “Há seis anos, eu vendia e alugava, na maioria das vezes, para imigrantes pobres. Hoje temos mais bobos”, diz Sophie Mena, proprietária da agência imobiliária de L’Ourcq.
Como vantagens de se morar no bairro, a agente imobiliária lembra que o Bassin de la Villette está em plena expansão. “Hoje, o bairro é seguro, familiar. Isso pode ser visto nas pessoas que não moram perto, mas frequentam a vizinhança”, explica Sophie.
Esse é o caso de Mathias Alet. Quando teve de decidir onde comemoraria seu aniversário de 30 anos, não teve dúvidas e deixou o turístico bairro de Montmartre, onde mora, para fazer um piquenique com os amigos às margens do Bassin de la Villette.
“É um lugar muito agradável, com gente descontraída e com bastante espaço para jogar petanca”, explica o aniversariante.
A petanca que tanto atrai Mathias é uma variação francesa do jogo de bocha. Ao longo do Bassin de la Villette, é, sem dúvida, o esporte mais praticado por quem só quer aproveitar a vida sob um dia de sol.