Brinquedo tradicional é o que mais vende no Círio de Nazaré
Data simbólica da religiosidade popular é quando os artesãos de Abaetetuba mais vendem brinquedos de miriti no Pará
A comemoração religiosa mais importante do Pará e uma das maiores do país, o Círio de Nazaré, celebrado em Belém, é a maior oportunidade do ano para vender o tradicional brinquedo de miriti, produzido principalmente pelos artesãos de Abaetetuba, cidade localizada a 50 quilômetros da capital paraense, o principal centro desta cultura criativa e empreendedora.
O miritizeiro é uma palmeira comum na região, mais presente no interior. Usada para fazer de cestos a rabiolas de pipa, tem aspecto de esponja, espécie de isopor natural. Os brinquedos produzidos com o miolo do miriti, leve e poroso, são patrimônio cultural do estado, imaterial do Brasil e um ícone do Círio de Nazaré.
Os dois dias mais rentáveis de venda dos brinquedos são hoje, no Círio de Nazaré, e na MiritiFest, em Abaetetuba, em maio – neste ano, um cartão emitido pela prefeitura financiou R$ 70,00 a cada criança de creche para comprar brinquedos de miriti.
A produção é realizada em família ou individualmente. “Passei a conviver com muitos produtores para aprender como eles trabalhavam e o que fazia parte do seu cotidiano. O brinquedo popular entrou na minha vida fortemente”, recorda o professor e artesão Ricardo Andrade.
Antônio de Souza, o Toninho, preside a Associação dos Artesãos e Produtores do Artesanato de Miriti, que reúne 28 produtores, divididos em sete núcleos familiares. Neste ano, a prefeitura de Abaetetuba cadastrou 30 homens e dez mulheres que fazem brinquedos de miriti – pequenos animais, barquinhos, esculturas.
Nesta entrevista ao Visão do Corre, Toninho detalha o processo de trabalho desde a produção, passando pela logística, volume de peças e os valores para que as artesãs e artesãos cheguem hoje a Belém, no Círio de Nazaré, para o principal dia de vendas de brinquedos de miriti.
Quantas associações de artesãos existem em Abaetetuba?
São quatro, mas muitos artesãos não participam de associação. No Círio, se cadastram para a festa e vão para Belém. Hoje, nós temos empresários, somos microempreendedores.
O que falta para formalizar mais gente?
Colocar a prefeitura para mapear todos os artesãos, são poucos formalizados, os mais antigos não se preocupam muito. Precisa de acesso à linhas de crédito. Existe o cheque para moradia, né? Poderia ser inventado um cheque ateliê, para ajudar o artesão.
Vocês têm inovado a produção de brinquedos?
A gente fez muitos cursos, nos apresentaram outros produtos que evoluíram, a textura, o acabamento do brinquedo é muito melhor. Antigamente, se pintava com tintas extraídas da natureza. Hoje, a gente usa com base de água, usa massa corrida, selador, que é um produto aplicado na madeira. Dá um acabamento muito bom na hora de lixar e pintar.
Isso não descaracteriza a arte?
Não, você usa um produto industrializado para dar uma textura de pintura melhor, mas o processo é sempre o mesmo: o artesão vai pintar, esculpir, cortar e lixar à mão. Ainda é o processo manual do artesanato.
Quais são os brinquedos de miriti mais vendidos?
A maioria é tradicional, retrata a vida indígena, ribeirinha, o cotidiano, os barcos, as montarias, pombinhas, tatuzinhos, cobrinhas, isso é um brinquedo tradicional, que está sempre no auge.
Vocês vendem mais no Círio?
A campeã de venda é o Círio. Mas tem artesão formalizado que participa direto de feiras fora do Pará. O seu Miranda, da nossa associação, tem um núcleo com a família, três filhos e a esposa, que pinta muito, é uma fera para dar acabamento nas peças. E o marido sai para as feiras em Pernambuco, Fortaleza, Bahia, Rio, São Paulo. Ele tem uma produção muito grande, admiro o empreendedorismo dele.
Quanto uma família vende, em média, no Círio?
Varia: tem família que vende cinco mil, outra vende sete mil reais.
Quanto custa o brinquedo de miriti tradicional?
Varia de tamanho. A cobra, por exemplo: tem pequena, grande e média. Tem cobrinha que se mexe para 15 reais, mas também de 70, 80 reais. Brinquedos médios variam entre 25 e 30 reais. Os pequenininhos, miniaturas, custam cinco, quatro reais, peças de dez, oito centímetros. Peças mais produzidas podem chegar a três, cinco mil reais - tenho um colega que fez um barco veleiro, bem antigo, que dava uns três metros, custou cinco mil reais.
Qual o preço do miriti?
O cento de miriti bom está saindo em torno de 150 a 200 reais. Uma unidade, às vezes até 2 reais, um pedaço de dois metros e meio.