“Economia circular é mantra de favela”, diz empreendedora
Fundadora de startup de reciclagem liderada por mulheres, Saville Alves fala sobre periferia no Web Summit Rio
Cofundadora da Solos faz palestra sobre Potência Periférica em Design Circular. Iniciativa liderada por mulheres tem seis anos e conquista representatividade. Para a empreendedora, "existe tecnologia e conhecimento disponível para realizarmos transição energética, reciclagem em larga escala e recuperação de biomas"
Saville Alves, cofundadora da startup Solos, faz palestra em 18 de abril, no último dia do Web Summit Rio. Seu tema é Potência Periférica em Design Circular. No evento, considerado o maior da área no mundo, a baiana vai trazer, sobretudo, a experiência dos últimos seis anos à frente da Solos, que impactou mais de dois milhões de pessoas.
A startup atua em três frentes: entre quem gera embalagens descartadas, na gestão de resíduos e em sistemas inteligentes de coleta. A iniciativa é quase toda liderada por mulheres e está presente em seis capitais.
Uma das ações acontece nos carnavais paulista e baiano, junto às cooperativas de reciclagem. Neste ano, mais de R$ 1 milhão foram gerados para catadores.
Saville Alves coleciona prêmios. Foi apontada em 2022 como uma das 20 mulheres mais inovadoras pela Forbes e, no ano passado, a startup Solos recebeu o Prêmio Nacional de Inovação.
A empreendedora social conversou com o Visão do Corre.
Como você explicaria "economia circular" para uma mulher da favela?
Economia circular é o mantra de toda mulher de favela. É o jeito de darmos os mais variados usos a algo e pelo máximo de tempo. A roupa do filho mais velho, que vai para o filho mais novo. O pote de sorvete que vira vasilha para congelar feijão.
O que é "empreendedorismo de impacto"?
É o jeito de fazer acontecer com intencionalidade. Escolher uma realidade que você quer transformar e, com senso de ética e respeito pelas pessoas e pelo planeta, realizar. É esse o significado real. O que me emociona.
Considerando que a plateia de sua palestra não será de mulheres periféricas, como a mensagem poderá chegar a elas?
Essa palestra é uma oportunidade de compartilharmos com o público elitizado o que temos aprendido e trocado no ambiente e junto às pessoas das favelas. Inclusive, na véspera da palestra, eu fui conhecer a periferia de Duque de Caxias, onde iniciaremos um programa de educação ambiental em maio.
Poderia resumir um caso de impacto recente gerado pelo seu trabalho em comunidade periférica?
Desde o ano passado estamos implementando, junto à Prefeitura de Salvador, Universidade de Geórgia, nos Estados Unidos, e as Cidades Resilientes, um programa para identificar os tipos de resíduos presentes nas ruas de bairros de centro e periferia, categorizá-los e, um junto com a academia, cooperativas, lideranças comunitárias e representantes de grandes empresas, entender como implementar uma solução que despolua as periferias. Esta é uma solução de médio prazo e estruturante.
Você concorda que “empreendedorismo” pode ser uma expressão pomposa, mas, em geral, significa uma atitude de sobrevivência, muitas vezes desesperada?
No Brasil, a principal motivação é a fome e a circunstância é a escassez, sendo exceção os casos do empreendedorismo como uma vocação, um talento e um sonho grande. Mas também tenho refletido sobre a importância de dar um significado de maior dignidade a profissões historicamente marginalizadas e que, com o MEI, têm sido possível criar novos imaginários e gerar profissionalização.
Podemos ter chegado a um ponto de não-retorno na questão ambiental. Em relação aos resíduos, ainda há solução possível?
Existe tecnologia e conhecimento disponível para realizarmos transição energética, reciclagem em larga escala e recuperação de biomas. O poder da criação humana é inimaginável. É só olharmos como a vida mudou em vinte anos. O problema é grande. Inegável. Fazer barulho sobre o que nos incomoda e usarmos nossas forças para influenciar é o único caminho possível.