Projeto social quer preservar memória de mãe de santo na BA
Instituto da Mulher Negra Mãe Hilda Jitolu dá continuidade ao legado iniciado em terreiro de candomblé há um século
Salvador ganha uma instituição cultural que leva o nome de um dos maiores símbolos das religiões de matrizes africanas: o Instituto da Mulher Negra Mãe Hilda Jitolu, fundado para preservar as memórias e fortalecer o legado familiar de resistência dentro do Curuzu, periferia da capital baiana, conhecida como pequena África.
O nome do Instituto homenageia Hilda dos Reis Dias, fundadora do Terreiro Ilê Axé Jitolu. Conhecida como Mãe Hilda, ela foi mais do que uma praticante do candomblé: atuou como liderança no bairro durante meio século.
Nascida em 6 de janeiro de 1923, a neta de africanos trouxe o poder feminino que, segundo a crença religiosa, rege o universo. Ao longo dos seus 86 anos de vida, Mãe Hilda construiu uma grandiosa história de conscientização na comunidade negra. Um dos exemplos é a grande contribuição na criação do primeiro bloco afro do Brasil, o Ilê Aiyê.
No centenário, instituto homenageia mãe de santo
Neste ano, em homenagem ao centenário de nascimento, o Instituto da Mulher Negra Mãe Hilda Jitolu é inaugurado com o propósito de manter viva a trajetória de mulheres negras. Quem assume a direção é Valéria Lima, integrante da casa onde atuou sua avó. A neta da mãe de santo é jornalista e mestra em Estudos Étnicos.
“Sinto que estou cumprindo uma missão ancestral. É a minha forma de contribuir com a sociedade, contribuir com as mulheres negras e com o crescimento delas, acima de tudo” diz Valéria. Ela relembra que sua avó dava muita importância à educação. “O que a gente está fazendo é dar continuidade”.
O objetivo do Instituto é a formação para mulheres. Neste momento, apenas pessoas do terreiro estão à frente da iniciativa, como a irmã gêmea de Valéria, e sua mãe.
Primeiras atividades de formação
O Instituto realizou oficinas de bordado, tranças, dança e arte em tecido. Uma dessas formações foi desenvolvida com o apoio do fotógrafo Robério Braga. Ele tinha interesse em reverter metade do valor das vendas do seu livro, Tranças Barrocas, a uma organização social que trabalhasse com crianças.
“Foi um recurso num momento interessante. A gente ainda não tinha feito nenhuma atividade para o público e queríamos sondar o que interessava, entender por qual caminho a gente deveria seguir”, explica Valéria.
Recentemente, o Instituto realizou um curso de tranças com apoio do Fundo Brasil de Direitos Humanos, organização de fomento. Com isso, conseguiu pagar advogado e contador para formalizar a instituição, além de realizar reforma de uma das salas, agora utilizada como ateliê.
Curso de tranças gera empoderamento e renda
O curso de tranças realizado no bairro do Curuzu, além de oportunizar aos jovens e mulheres um novo aprendizado para geração de renda, proporcionou momentos de descontração, afetividade e trouxe uma nova perspectiva de vida.
Isso aconteceu com Raite Oliveira, 32 anos. “Eu queria aprender a arte das tranças, inicialmente, como hobby, mas me aprimorei, aprendi novas técnicas. Foram seis dias de trocas de afeto. As tranças vêm se atualizando, junto com o mundo”.
Hoje ela entende que essa atividade pode gerar renda e contribuir com a vida de outras mulheres. Naides Tiffer Xavier dos Santos, 34 anos, concorda. Para ela, o curso de tranças foi uma oportunidade única, agregando valores e, principalmente, abrindo uma porta para o empreendedorismo.
Biografia e documentário
O Instituto da Mulher Negra Mãe Hilda Jitolu está em fase de captação de recursos. Até o momento, conseguiram o valor necessário para publicar a biografia de Mãe Hilda Jitolu, que deve ser lançada no próximo ano. Um documentário sobre o Instituto está em processo de criação, com previsão de produção ainda neste ano.