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Atleta do taekwondo é da “área mais humilde do bairro mais humilde”

Henrique Marques disputa 1ª Olimpíada em Paris. Ele é de Porto das Caixas, periferia de Itaboraí, interior carioca

8 ago 2024 - 17h37
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Resumo
Com 20 anos, o atleta olímpico Henrique Marques é filho de mãe diarista e pai peão de obra. Tem cinco irmãos. Começou no jiu-jitsu, se interessou pelo taekwondo, largou, pensou no futebol, retomou o taekwondo e foi campeão brasileiros aos 15 anos. Não tem patrocínio de empresa, vive de Bolsa Atleta e mudou com a família para uma casa melhor, no mesmo bairro periférico de Itaboraí.
As dificuldades diminuíram quando Henrique Marques chegou à seleção brasileira, em 2019.
As dificuldades diminuíram quando Henrique Marques chegou à seleção brasileira, em 2019.
Foto: Rafael Reichert/COB

Se você é sensível a fortes emoções, evite o Instagram de Henrique Marques, atleta brasileiro de 20 anos, estreante em Olimpíada, lutador de taekwondo. 

Na rede social do carioca você vai encontrar o vídeo junto com a mãe, caminhando pela enxurrada, carregando malas pelos becos de Itaboraí. Na ocasião, o atleta saía debaixo de chuva para disputar o campeonato mundial.

As imagens também mostram a cama furada e a geladeira, quase vazia, com uma tranca improvisada. E a panela sem comida. O texto da postagem, acachapante, homenageia a mãe Rosiane Marques, diarista de 55 anos.

A mãe Rosiane Marques e o filho atleta Henrique Marques, que tem cinco irmãos. Pai trabalha em obras.
A mãe Rosiane Marques e o filho atleta Henrique Marques, que tem cinco irmãos. Pai trabalha em obras.
Foto: Arquivo pessoal

A família é do Porto das Caixas, periferia de Itaboraí, interior do Rio de Janeiro. O pedaço específico onde está o beco com a casa de Henrique Marques chama-se Vila Portuense.

Mas, por causa de um valão próximo, que enche de esgoto quando chove, recebeu o apelido desonroso de “vale da merda”.

Caminhada, com voadoras pelo caminho

O atleta olímpico tem cinco irmãos. Estudou em escola pública, treinava jiu-jitsu, mas de tanto assistir, vidrado, aos treinos de taekwondo, ganhou uma bolsa para pagar metade da mensalidade, R$ 25,00. Era difícil pagar.

“Se você vence todo dia, em qualquer momento da vida vai vencer também”, diz Henrique Marques na Olimpíada de Paris
“Se você vence todo dia, em qualquer momento da vida vai vencer também”, diz Henrique Marques na Olimpíada de Paris
Foto: Arquivo pessoal

Com o pai trabalhando em obras e a mãe, nas casas das patroas, fizeram os inevitáveis corres. Em 2018, para disputar o campeonato brasileiro em Cuiabá, a mãe pediu cartão emprestado de parente para pagar metade das despesas.

“Eu também dava meu jeito. Fazia rifa de ventilador, de chocolate, vendia na escola, na rua”, lembra Henrique Marques.

Ainda em 2018, na troca de faixa, “minha mãe teve que pegar dinheiro emprestado”. Mas em 2019, um alívio: Henrique Marques entra para a seleção brasileira, com viagens custeadas.

“Mas sempre foi essa correria de pegar cartão com os outros, dinheiro emprestado para devolver em não sei qual mês”.

O atleta conversou com o Visão do Corre em Paris e contou um pouco mais sobre sua caminhada, com voadoras pelo caminho.

Henrique Marques sobrevive do Bolsa Atleta, mora em casa melhor, mas no mesmo bairro, que representa com orgulho.
Henrique Marques sobrevive do Bolsa Atleta, mora em casa melhor, mas no mesmo bairro, que representa com orgulho.
Foto: Arquivo pessoal

Conte um pouco do lugar onde foi criado.

Nasci em Itaboraí, desde que eu nasci eu moro em Porto das Caixas. Eu morava na área mais humilde do bairro que já é humilde. A área mais pobre é conhecida como Vale da Merda. O nome correto é Vila Portuense. É um beco bem pequeno, não passa carro, muito mal passa uma moto.

Como era viver lá?

Passei dificuldade de comer, minha casa alagava quando chovia, ficava inundada, tinha que tirar com balde. O beco também alagava. Era muito difícil sair. Para não sujar o tênis, tinha que por a sacola no pé.

A casa era muito humilde, três quartos, uma sala, um banheiro minúsculo, uma cozinha e telha. Quando estava sol, parecia um micro-ondas. Não tinha asfalto.

Sua vida melhorou com a prática do esporte?

Consigo viver do esporte, consegui sair daquela casa do beco, estou no mesmo bairro, mas moro numa casa melhor. O taekwondo me proporcionou isso.

Atletas olímpicos de taekwondo desfilam em Itaboraí. No centro da imagem, Edival Pontes, o Netinho, bronze em Paris.
Atletas olímpicos de taekwondo desfilam em Itaboraí. No centro da imagem, Edival Pontes, o Netinho, bronze em Paris.
Foto: Arquivo pessoal

Além da modalidade esportiva que você representa, como se vê representando sua quebrada?

Eu represento o bairro onde eu morro, minha cidade, muita gente me para na rua, fala que a medalha olímpica vai ser nossa. As pessoas olham para mim e se inspiram.

Como imagina que será sua participação na Olimpíada?

Estou muito confiante, mano. A gente vem treinando muito, fiz campeonatos-teste e me destaquei, fui bem em todos. Eu lutei contra quase todos os adversários e tive um resultado muito bom. Estamos focando na medalha, se Deus quiser vai dar certo.

Quem você gostaria de inspirar?

Eu acho que gostaria de inspirar as pessoas que estavam no meu lugar, que não receberam crédito, que são desacreditadas, que vem da mesma linhagem, da mesma dificuldade. Pessoas que tem um futuro muito grande, mas moram num lugar muito pequeno, e que sonham.

O que estará passando pela sua cabeça antes de começar a primeira luta?

Na minha cabeça vai estar que eu passei por muita coisa, tive um problema de arritmia cardíaca, então tem que valer a pena. Não posso desperdiçar a oportunidade. Tem algo que eu acredito.

Fonte: Visão do Corre
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