Projeto usa taekwondo para promover inclusão social em MG
O guarda municipal Itamar da Silva se desfez da própria casa para conseguir abrir o espaço onde atualmente dá aulas para 80 alunos
Praticar esporte de luta contribui para a melhora da capacidade física, proporciona aumento da força e da massa muscular, ajuda na flexibilidade e no equilíbrio. Mais do que trabalhar com o físico, o esporte tem outras funções na vida de favelados e periféricos: promover a inclusão social, transmitir valores humanos, cortesia, integridade, autocontrole e perserverança.
Dentro de duas comunidades populares de Belo Horizonte, Aglomerado da Serra e Alto Vera Cruz, o projeto Itamar auxilia crianças e adolescentes na luta pela dignidade e igualdade. Fundado pelo guarda municipal Itamar da Silva, de 50 anos, desde 2005 o projeto aposta no valor do esporte para formar cidadãos conscientes de seus direitos e deveres.
Itamar é faixa preta pela Federação Mineira de Taekwondo. Morador da comunidade, observou que o esporte era inacessível às pessoas de baixa renda e teve a ideia de ministrar aulas para os jovens do local. Hoje são atendidos cerca de 80 alunos, de 5 a 16 anos, e alguns adultos.
Sem ajuda pública ou privada, o professor se desfez da própria moradia para dar um espaço digno ao projeto. A maioria das aulas são feitas na laje e quando chove improvisam uma pequena sala na parte de baixo. A estrutura precária não é impedimento para as atividades acontecerem. É assim que pensa Itamar: "minha motivação foi a necessidade de ajudar o próximo, de proporcionar à comunidade algo útil que agregue valor na vida das pessoas."
Além do compromisso com a comunidade, o guarda municipal trabalha no intuito de mostrar aos jovens o outro lado da favela. "Onde não tem só crime e crianças com radinho no pescoço", explica. A presidente e coordenadora do projeto, Laudilene Benevides, de 41 anos, presencia a transformação das crianças e adolescentes ao ingressarem na luta esportiva. "Ela educa, sensibiliza e possibilita o desempenho de qualidades pessoais, levando crianças ao encontro de si mesmas, despertando nelas também o desejo de contribuírem para um futuro melhor", completou.
A coordenadora reforça a importância do esporte no combate à criminalidade. "A base do esporte de luta é a disciplina. Ao ingressar no projeto, o comportamento deles muda da água para o vinho, tanto em casa quanto na escola", comentou. São dezenas de casos de professores e pais que procuram Itamar para agradecerem pelo impacto das aulas na vida dos jovens.
E o caminho inverso também acontece. Laudilene conta a história de uma aluna que entrou no projeto aos 11 anos. Filha de usuários de crack, vivia na rua, brigava, sofria violência doméstica. Devido ao contexto familiar, ela e a irmã foram entregues ao Conselho Tutelar. Para que ela não parasse de lutar, a coordenação do projeto conseguiu intervir e resgatar a menina, que foi morar com uma tia. A garota continuou os treinos, foi campeã mineira e campeã internacional. Hoje, aos 19 anos, trabalha e tem um estilo de vida diferente do início da sua infância.
Os pais sabem que lá é um local seguro. Laudilene acredita que um jovem praticante de qualquer esporte, quando é dedicado e recebe apoio, dificilmente segue para outros caminhos e pratica atos impróprios.
Outras ações:
Atualmente, o espaço está pequeno para a quantidade de pessoas que se interessam pelo esporte na comunidade. O projeto se mantém por meios próprios e através de doações e rifas. "Precisamos melhorar a autoestima deles, mantê-los ocupados, direcioná-los a um caminho pleno de forma amiga e solidária através do trabalho em equipe", argumentou. A coordenação sonha em ampliar o número de atendimentos, levar mais crianças para disputarem campeonatos pelo mundo, oferecer equipamentos de treino de qualidade.
Os planos de crescimento do projeto Itamar não se limitam em uma única luta. Ainda para 2022, o objetivo é ampliar a sede de 64 metros para inserir novas oficinas: jiu-jitsu, balé, informática, cursos profissionalizantes, atendimento jurídico, cinema e fotografia, inglês, oficina de pintura e grafite. Almejam também formar uma cooperativa de mulheres, a fim de auxiliar desempregadas e mães que precisam obter renda sem sair de casa.
No local há um galpão com uma cozinha profissional para oficinas de culinária, que ensinam os moradores a aproveitarem e reaproveitarem os alimentos sem desperdício. O espaço pretende promover oficinas de geração de renda com orientações sobre o descarte do lixo doméstico, compostagem, contribuindo para a redução do lixo e criando novos utilitários para venda ou consumo próprio.