Jornal Nacional, direto de Porto Alegre, não cobriu periferia
Telejornal parece ter esquecido de que quem paga mais caro pelas mudanças climáticas são os mais pobres
O Jornal Nacional veiculou oito edições transmitidas de Porto Alegre, mas nenhuma citou diretamente a periferia da capital, nem esclareceu se estava em áreas pobres. Embora houvesse boa cobertura, pois havia estrutura adequada e repórteres ao vivo em diversas cidades, as chamadas "vilas", as periferias de Porto Alegre e do interior, não entraram no foco.
O Jornal Nacional veiculou oito edições apresentadas diretamente de Porto Alegre e, em nenhuma delas, destacou, especificou ou contextualizou a tragédia na periferia da capital.
Chegou a citar, de passagem, uma ou outra área afetada e afastada do centro, como Sarandi, jamais informando as características periféricas. Triste, porque a cobertura foi boa, começando pela sacada em apresentar o telejornal a partir de locais relacionados à tragédia, como abrigo ou cozinha comunitária.
Sempre chama a atenção a admirável a sequência de repórteres ao vivo entrando de diversas cidades, além de helicóptero, drones e toda estrutura profissionalíssima da Globo funcionando azeitada, com jornalistas e técnicos locais, além dos trazidos de outras praças.
Mas nas quebradas que os gaúchos chamam de “vilas”, nada. Em Porto Alegre, a cobertura foi focada no centro histórico, no mercado municipal, nas margens do Guaíba e em locais onde turistas costumam ir, no final da tarde, ver o pôr-do-sol.
Nem na capital, nem no interior, o Jornal Nacional informou as características sociais dos municípios e bairros. Não sabemos se eram pobres ou ricos. O que não estávamos vendo debaixo da água, devia ter sido explicado.
Dois exemplos: ao mostrar as ilhas do Guaíba, “densamente povoadas”, a reportagem não esclarece se pessoas pobres moram ali. No último dia de cobertura, William Bonner colocou o colete e foi a campo, quer dizer, à água.
Transitando com bombeiros pelas ruas alagadas, não sabemos se mostrou bairros periféricos e, considerando os topos dos sobrados, prédios e casas filmadas, não parecem vilas.
Por falar em vilas, terceiro e último exemplo. No primeiro dia da cobertura, em 6 de maio, um morador declara o seguinte: “o que vocês vão ver na televisão não é nem dez por cento do que está realmente acontecendo aqui. Eu nasci e me criei ali na vila”, disse o entrevistado.
Mas o Jornal Nacional não informou qual era a vila.