Nonato Araripe: músico que leva o forró pé de serra para os palcos e vai montar museu do triângulo
Triangulista do grupo Trio Amizade conta como a música é presente em sua vida e fala da mistura do forró com o carnaval e a memória
Morador há 34 anos do Itaim Paulista, bairro na zona leste de São Paulo, Raimundo Pereira da Silva, 59, o Nonato Araripe, faz do forró o remédio para as saudades do sertão. Por meio da música, o artista da cidade de Araripe, região do Cariri, no sul do Ceará, produziu eventos, montou um acervo de triângulos e estabeleceu pontes entre o ritmo e o carnaval.
“São Paulo é a cidade mais nordestina do Brasil. É onde tem a maior concentração de nordestino. Eu mesmo vim para cá com 15 anos e sentia saudade do sertão, chorava sentindo falta desse forró pé de serra”, afirma.
A música trilha o destino da família do artista. O avô de Nonato tocava sanfona de oito e de 120 baixos, e o pai, também sanfoneiro, é mestre de Reisada, festa em celebração ao Dia de Reis.
“O forró é um vício bom. Está dentro da gente. Para mim, está no DNA. Se eu parar de tocar forró, adoeço. Ele é minha vida.”
Nonato chegou a São Paulo no final dos anos 1970 e, aos 15 anos, trabalhou em uma fábrica de móveis na Mooca, na zona leste, antes de se tornar metalúrgico em uma indústria de peças de automóveis. Para se divertir, em 1980, participou da Associação dos Amigos da Praça do Forró.
“A presença nordestina na zona leste é muito forte. Nós ficávamos pela Praça do Forró, que era o lugar para se distrair, sem perturbar a ordem e que a polícia não perturbava. Ficamos lá por muitos anos”, conta.
A Praça do Forró fica ao lado da estação São Miguel, da linha 12-Safira da CPTM, e foi um local de apresentações de forró entre os anos 1970 e 2000.
Ao participar das apresentações, Nonato conheceu diversos grupos de forró da cidade de São Paulo e encontrou no CTN (Centro de Tradições Nordestinas), no bairro do Limão, na zona norte da capital, um espaço para reunir os artistas.
“Fui produtor do projeto ‘Forró de Verdade’, no CTN, onde levei grupos de forró pé de serra para se apresentar. Eram conjuntos davam shows de graça pela cidade e lá dentro conseguimos dar cachê e público para eles, pois o público do CTN quer ouvir música da terra, sem modismo”, justifica.
Pelo bom relacionamento com os músicos, Nonato já conseguiu 20 triângulos, o instrumento que toca, para montar o Memorial do Triângulo, uma espécie de museu com o objetivo de preservar as memórias e trabalhos dos grupos de forró pé de serra.
“Tô com 20 triângulos de várias bandas e estão prometidos mais alguns, como o triângulo da Marinês, do Falamansa e do Rastapé, que também já prometeu o dele. A ideia é reunir triângulos de vários trios de forró tradicionais e montar exposições para o público”, indica.
Em 2009, Nonato criou o seu primeiro conjunto de forró, o Trio Arcoverde. O grupo fazia apresentações em bares e casas noturnas, mas terminou por desacordos de agenda e logística. O pai do músico percebeu a tristeza do filho e o aconselhou a formar um novo conjunto com o sanfoneiro Mestre Louro. Surgia o Trio Amizade.
“Em 15 de janeiro de 2012, ano do centenário de Luiz Gonzaga, o Trio Amizade fez o seu primeiro show. A gente via a alegria do rosto do público. As pessoas aplaudiam e cantavam junto com a gente”, relembra.
O trio de forró de pé de serra é formado por Nonato, que canta e toca triângulo, por Mestre Louro, cantor principal e sanfoneiro, e Sérgio Maurício, na zabumba e voz de apoio. Para Mestre Louro, o amigo é um impulsionador do conjunto.
“O Nonato é um cara muito bacana, sempre está procurando projetos e espaços para a gente tocar. Ele toca aquele triângulo dele e se aplica bastante a tudo o que faz, inclusive, na mistura do forró com o carnaval. Ele mistura as folias, é algo maravilhoso”, diz Mestre Louro.
Criativo, Nonato Araripe fez algo inovador ao misturar o forró pé de serra com sambas-enredos. Em 2011, a convite do carnavalesco Wagner Santos, Nonato desfilou no sambódromo do Anhembi pela primeira vez com a Acadêmicos do Tucuruvi. O enredo da escola era ‘'Oxente, o que seria da gente sem essa gente? São Paulo: a capital do Nordeste', que prestou uma homenagem aos nordestinos na cidade.
De lá pra cá, Nonato desfilou nas escolas de samba Imperador do Ipiranga, Dragões da Real, Tom Maior e Pérola Negra com o Trio Amizade. Neste ano, o grupo esteve em um dos carros alegóricos de destaque no desfile da Mancha Verde. A escola defendeu o enredo "Oxente - Sou Xaxado, sou Nordeste, sou Brasil" e ficou com o segundo lugar do carnaval de São Paulo.
“Foi muito marcante para o Trio Amizade. A gente colocou o forró e o cangaço dentro do carnaval, a maior festa do país. Foi impactante ver nossa cultura sendo aplaudida na avenida, a gente, ali, no carro do Luiz Gonzaga. Vi muito nordestino chorando de emoção.”
O trio já participou de programas de TV, gravou comerciais e se apresentou em diversos festivais nacionais. Para o músico, o forró alimenta e satisfaz a alma.
“A gente vai para o palco e sente como se tivesse com muita fome e o Senhor deu aquela comida para você, que é o forró. Quando você se apresenta é como se enchesse a barriga. É aquela sensação de satisfação”, finaliza.