Fome e excessos: a quebrada e a necessidade por reeducação alimentar
Dietas impossíveis, receitas milagrosas, superalimentos, entenda porque isso não resolve nada
A periferia brasileira vive um dilema cotidiano, ou passa fome, ou se alimenta extremamente mal. Por um lado, temos o sistema econômico que beneficia uma classe econômica, que pode comprar alimentos de qualidade e se informar sobre os alimentos.
Por outro, uma massa de trabalhadores sem informações de qualidade, morando em regiões distantes dos principais fluxos e com muita dificuldade financeira.
Para trocarmos uma ideia sobre alimentação saudável na periferia, não basta apenas abordar o tema da reeducação alimentar de maneira isolada da realidade social, política e econômica.
Segundo dados do Instituto Data Favela, de 2021, 70% dos moradores de favela não têm dinheiro para comprar comida. Essa é a realidade.
Não ter dinheiro para acessar o alimento é um problema gravíssimo, mas essa não é a única questão, porque se a maioria não tem recursos para obter alimentos, que dirá ter acompanhamento de nutricionista, saber o que comer, e poder escolher como comer e seguir as recomendações nutricionais.
O cenário é de uma extrema desigualdade social, que impacta diretamente nas decisões individuais das populações de baixa renda.
Por exemplo, uma família periférica, com problemas financeiros, dívidas e falta de informação, sendo estimulada diariamente a consumir ultraprocessados de baixíssima qualidade, provavelmente não vai ter uma alimentação saudável, ou vai se reeducar.
Em relação ao consumo de ultraprocessados, precisamos levar em consideração o sabor viciante dos produtos, a praticidade, o baixo custo e também uma ideia socialmente estabelecida de ascensão ao consumir ''produtos industrializados''.
O consumo de produtos ultraprocessados é viciante, e gera dependência. Tendo isso em vista, é preciso pensarmos em se alimentar de maneira mais adequada.
São produtos que apresentam pouco valor nutritivo, enquanto, por outro lado, são ricos em sódio, gorduras saturadas, gorduras trans e açúcar refinado.
É urgente uma mudança no sistema de produção alimentícia, na distribuição de renda, no fim dos pântanos e desertos alimentares.
Mas de encontro a essas mudanças, é preciso modificações nas decisões individuais, que passa por uma consciência sobre a reeducação, autonomia e soberania alimentar.
Outro ponto, são os subsídios que empresas de ultraprocessado recebem, isso precisa acabar. É preciso, também, controlar a publicidade massiva destes produtos.
Por outro lado, o Estado tem o dever de subsidiar e apoiar os pequenos produtores, que produzem a maioria da comida brasileira, como arroz, feijão, frutas e vegetais.
Promover uma reforma agrária, para que a comida seja produzida de maneira mais local e por múltiplas famílias. Ou seja, precisamos de políticas públicas para modificar essa realidade.
É preciso uma mudança estrutural para que as pessoas possam ter acesso e condições de acessar alimentos de qualidade e nutritivos. Mas junto a isso a reeducação alimentar, indo na contramão desta noção de dietas da moda, se faz imprescindível.
Pega a visão, e se liga nos dados:
De acordo com um estudo realizado por pesquisadores da USP, FioCruz, Unifesp e Universidad de Santiago de Chile, o consumo de calorias advindo dos ultraprocessados cresceu de 14,3% no período de 2002/2003 para 19,4% em 2017/2018 da dieta diária nas casas brasileiras.
Nesse mesmo período, o IBGE aponta que o percentual de obesidade entre pessoas de 20 anos ou mais passou de 12,2% para 26,8%. Ainda, conforme o estudo, cerca de 57 mil mortes anuais são atribuídas ao consumo de ultraprocessados.