O veganismo periférico é diferente do veganismo de classe média
O veganismo periférico é totalmente diferente do veganismo de classe média, não teria como ser igual e nem próximos
Não existe a possibilidade de falar sobre mudanças de hábitos, veganismo, vegetarianismo, o que seja sem considerar as camadas sociais e as diversas realidades brasileiras.
Virar vegano na periferia é totalmente diferente de uma pessoa que mora num bairro privilegiado com grana. Começa que na quebrada não temos quase nada de opção de produtos industrializados, como hambúrgueres vegetais e leite de caixinha, na nossa região o acesso é bem limitado. Mesmo que tivéssemos opção, a grana é curta e dá só para o básico.
Não ter tantas opções na periferia nos transformou e nos mostrou outra forma de enxergar o veganismo, a alimentação. Agradecemos diariamente por nascer e crescer em uma região periférica e bem afastada do centro privilegiado.
Embora tenham periferias com desertos alimentares, é muito comum encontrar vegetais, legumes, grãos e frutas em diversos lugares, o que torna acessível praticar o veganismo em quase qualquer lugar.
Deixar de consumir produtos de origem animal gera algumas dúvidas, com o que substituir, o que comer, ''será que vou precisar gastar 20 reais numa caixinha de leite vegetal, vou ser obrigado a pagar 25 reais em 4 salsichas de soja?'', entre outras coisas.
Essas dúvidas são comuns, e a resposta é que não há necessidade em substituir nada, é só tirar o leite, o ovo, a carne e continuar comendo o que costumamos comer (vegetais), e entender que esses produtos industrializados de origem vegetal são opcionais e ainda muito inacessíveis a maioria da população, principalmente para quem vive em favelas e periferias.
É importante entender isso, a partir daí buscar uma alimentação baseada em vegetais, essencialmente com abundância de arroz e feijão. Uma coisa tem que ficar clara, não precisamos ir pro centro, buscar opções, precisamos olhar para nossa realidade e lidar com ela, se modificar, se arriscar, abrir a mente e agir.
Ser vegano na periferia faz com que a gente cozinhe mais, desenvolva uns preparos, justamente por conta da falta de acesso e grana. Preparar em casa pastas, queijos, hambúrgueres, leites vegetais, fica muito mais barato e não é tão demorado quanto preparar rangos tradicionais.
Foi nos arriscando que descobrimos isso, do contrário estaríamos aqui criticando o veganismo, chamando de elitista, excludente e consumindo pedaços e derivados de animais inocentes (o que não queríamos e não queremos).
Não precisamos buscar receitas com centenas de ingredientes, muito específicos, com ingredientes básicos e sem muita firula é possível fazer diversos preparos rápidos e sem gastar muito.
Por exemplo, costumamos fazer leite vegetal em casa, e não fazemos leite de castanha, de avelã, de amêndoas, geralmente fazemos leite de amendoim, de aveia, utilizamos alimentos que estão ao nosso alcance e seguimos.
Preparos como pães, bolos, tortas, podem ser feitos de maneira muito simples, com ingredientes encontrados em qualquer lugar. Fuja das receitas muito elaboradas, a não ser que tenha tempo, uma grana sobrando e queira fazer algo mais especial.
De modo geral, ser vegano na periferia não é nada impossível, nunca tivemos grandes dificuldades, e contamos com a sorte de ter uma horta comunitária há 1 km de casa (verifique se na sua região tem uma horta comunitária).
Claro que não dá para negar que é bem mais difícil comparado com a mordomia que muitas pessoas de classe média tem, como dinheiro para comprar produtos, muitas vezes funcionários trabalhando em casa ajudando na cozinha e até mesmo tempo para pesquisar, estudar, e se aprofundar.
Se tornar vegano na quebrada é diferente, não só por conta da questão alimentar, mas também do convívio social, as questões culturais, as confraternizações, tudo é muito diferente. Porém, vivemos um veganismo real, popular, pés no chão e menos superficial.