Blocos se viram para sobreviver sem carnaval em SP
Na zona sul, Bloco do Beco fez uma mudança em sua sede, enquanto o Jah É, na zona norte, participa de eventos fechados para cobrir gastos
Tradicional bloco de carnaval da zona sul, o Bloco do Beco completa 20 anos em 2022 e desfilaria pelo Jardim Ibirapuera, na região do Jardim São Luís, no próximo sábado (26). O verbo ‘desfilar’ é usado no futuro do pretérito porque, por mais um ano, isso não poderá acontecer.
O carnaval de rua em São Paulo foi cancelado pelo segundo ano consecutivo por conta da pandemia de covid-19. Ao contrário dos desfiles das escolas de samba, adiados para o mês de abril, não há previsão de que os foliões possam curtir o feriado nas ruas da cidade neste ano.
A decisão da Prefeitura de São Paulo foi tomada na primeira semana de janeiro, mas antes disso, mesmo com inscrição feita, a equipe do Bloco do Beco já havia optado por não desfilar em 2022.
“Em dezembro, o índice de vacinação ainda estava em 70%, se não me engano, e a gente fez uma conta de que teriam cerca de mil pessoas não vacinadas no nosso bloco”, conta Lenon Farias, de 25 anos, produtor cultural e mestre de bateria.
“Achamos isso super delicado e perigoso, porque tem muitos idosos, é um carnaval bem familiar mesmo. Nosso medo de expor essas famílias falou mais alto e, mesmo se houvesse a liberação, talvez não teríamos nosso carnaval”, complementa.
Em substituição ao desfile, o Bloco do Beco optou por derrubar os muros que o separava do Jardim Ibirapuera, literalmente. No último fim de semana, foi feito um mutirão para derrubar o muro na entrada da sede, tornando-a visível a quem passa pelo bairro.
“A gente tinha o sonho de derrubar porque, mesmo que fôssemos um espaço cultural conhecido no bairro, muitas pessoas passavam e não conseguiam olhar aqui dentro. Era algo que intimidava e elas optavam por não entrar”, afirma Farias.
Após o mutirão, foi feita uma roda de samba com a velha guarda do bloco. “A gente conseguiu ver a absurda diferença, muitas pessoas vinham chegando e se aproximavam. A galera que passava na rua ficava abismada, foi uma coisa bem bacana mesmo”, conta o produtor cultural.
Festas para fechar a conta
Na Freguesia do Ó, zona norte de São Paulo, o bloco Jah É, focado em reggae music, se preparava para fazer o terceiro carnaval de rua. Segundo a programação inicial divulgada pela Prefeitura, o Jah É, fundado em 2018, teria desfilado na tarde do último domingo (20).
Neste dia, ao invés do Largo da Matriz da Freguesia do Ó, o bloco se apresentou numa casa de shows na Vila Madalena, na zona oeste da capital. Investir nesses eventos fechados foi a saída encontrada pelos integrantes para cobrir gastos que tiveram na preparação para este carnaval.
“Tínhamos uma base para receber R$ 5 ou R$ 6 mil, divididos entre todos os nossos patrocinadores e apoiadores, que só viriam se houvesse carnaval. E a gente acaba absorvendo custos. Estamos com uma agenda de uns quatro, cinco shows nos próximos 20 dias para ver o que conseguimos recuperar”, conta o presidente do bloco Gustavo Vinicius, 39.
Produtor cultural e jornalista de formação, Gustavo se diz contra o cancelamento do carnaval de rua. “Todas as casas de shows estão abertas, com lotação máxima, sem máscaras. Se o povo serve para trazer lucro, para trabalhar, ser explorado até pegar a Covid-19, por que não pode uma festa popular e que tenha uma identificação social muito forte? O carnaval é o nosso maior feriado”, questiona.
Pensando em 2023, o Jah É pretende abrir uma escolinha de bateria a partir de abril deste ano para aumentar a quantidade de integrantes. Atualmente, a bateria do bloco conta com 27 ritmistas, sendo que apenas 12 deles participam das apresentações fechadas.