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Zumbi teve ajuda de um judeu e de um muçulmano em Palmares

Embora desconhecida, história está registrada em documentos oficiais, encontrados por acaso por um jornalista brasileiro

20 nov 2024 - 05h28
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Resumo
No Dia da Consciência Negra, o Visão do Corre narra o encontro improvável entre três pessoas reais que fizeram a luta em Palmares. Um náufrago árabe, resgatado por um judeu, que se juntaram à luta dos negros por liberdade.
Zumbi, pintura de Antonio Parreiras. Talvez só no Brasil seria possível acontecer um encontro multiétnico em um quilombo.
Zumbi, pintura de Antonio Parreiras. Talvez só no Brasil seria possível acontecer um encontro multiétnico em um quilombo.
Foto: Reprodução

Contrariando a tendência a não dar spoilers, a ajuda militar que Zumbi teve de um judeu e, especialmente, de um muçulmano, precisa ser conhecida. E resumi-la não apaga seu brilho.

Embora desconhecida, esta parte da história nacional, documentada oficialmente, está contada em um livro-reportagem cujo título faz jus ao conteúdo.

A Incrível e Fascinante História do Capitão Mouro, obra escrita pelo jornalista Georges Bourdoukan, narra a amizade de Zumbi com um judeu e um mouro, protagonista do livro, com participação decisiva nas fortificações e resistência do quilombo dos Palmares.

Mas como aconteceu esse encontro improvável? O mouro Saifudin, protagonista do livro, naufragou e, em Pernambuco, foi auxiliado pelo judeu Ben Suleiman. Não se conheciam. O judeu, cuja família tem pequena propriedade rural, é preso pela Inquisição.

O muçulmano o resgata. Fugitivos, vão parar em Palmares, onde Zumbi os acolhe e logo reconhece a capacidade militar do mouro. Passam a lutar juntos.

Topo da Serra da Barriga, em Alagoas, abrigou por quase cem anos o Quilombo dos Palmares, onde reinou Zumbi.
Topo da Serra da Barriga, em Alagoas, abrigou por quase cem anos o Quilombo dos Palmares, onde reinou Zumbi.
Foto: Divulgação

O capitão mouro

Personagem apaixonante, Saifudin, o capitão mouro, é valente, sábio e justo, tem fé inabalável.

Foi dele a ideia de construir armadilhas por toda a floresta ao redor de Palmares – buracos com lanças pontudas de madeira, cobertos com galhos e folhas.

Fatais, as armadilhas impuseram derrotas ao bandeirante Domingos Jorge Velho, contratado para derrotar Palmares. Em uma ocasião, os palmarinos tomaram seus mantimentos.

Foi também do capitão mouro a ideia de cercar Palmares com paliçadas, proteção com estacas que mediam sete quilômetros, protegendo o quilombo.

O mercenário Jorge Velho teve que aumentar seu exército e trazer mais armas, como canhões. No final da luta contra Palmares, eram 10 mil atacantes contra mil negros, entre eles o judeu e o mouro.

Monumento Zumbi dos Palmares. Dia da Consciência Negra é celebrado em 20 de novembro, data da morte de Zumbi em 1695.
Monumento Zumbi dos Palmares. Dia da Consciência Negra é celebrado em 20 de novembro, data da morte de Zumbi em 1695.
Foto: Fernando Frazão/AB

Reportagem tão incrível quanto a pauta

É uma pena que Georges Bourdoukan, jornalista de origem libanesa que chegou ao Brasil com dez anos idade, esteja recuperando a saúde e não possa dar entrevistas. Seu livro é um clássico que completa 25 anos.

Como acontece com todo repórter atento, o acaso se transformou em pauta. Quando consultava livros na Biblioteca Municipal Mário de Andrade, em São Paulo, encontrou um manuscrito do século 17.

Havia uma carta do governador da Capitania de Pernambuco, Caetano de Melo e Castro, reclamando ao rei de Portugal “de um certo mouro, construtor das fortificações do Quilombo dos Palmares”.

O governador responsabilizava o mouro pelas dificuldades em invadir e aniquilar o quilombo liderado por Zumbi. “Nunca mais esqueci o mouro”, escreveu o jornalista na introdução do livro.

Zumbi, que simboliza o Dia da Consciência Negra: herói presente no imaginário popular é representado em grafite.
Zumbi, que simboliza o Dia da Consciência Negra: herói presente no imaginário popular é representado em grafite.
Foto: Reprodução

Apuração refez caminho de Saifudin

Não foi fácil recuperar uma história de 300 anos. “Consultei dezenas, centenas de livros e nada. Nenhuma palavra sobre o mouro”, conta o jornalista. Ele vasculhou bibliotecas em São Paulo, Bahia, Pernambuco, Alagoas e Rio de Janeiro. Nada.

Então resolveu “fazer o percurso inverso”, ou seja, atravessou o oceano até Andaluzia, dali ao Marrocos, Argélia, Tunísia e Líbia. E encontrou um tesouro.

O jornalista Georges Bourdoukan teve passagem por diversos veículos importantes, como revista Placar e Rede Globo.
O jornalista Georges Bourdoukan teve passagem por diversos veículos importantes, como revista Placar e Rede Globo.
Foto: Reprodução

“O melhor mesmo foram as conversas com os beduínos do deserto e os berberes das montanhas”. As histórias orais desses povos preservaram a aventura de Saifudin por trezentos anos.

“Graças às histórias contadas por essa gente, que as ouviu dos avós e estes dos avós de seus avós, foi possível entender como o mouro veio parar no Brasil e como se deu sua participação na Guerra dos Palmares”, escreveu Georges Bourdoukan na introdução de A Incrível e Fascinante História do Capitão Mouro.

Fonte: Visão do Corre
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