Jovens do Grajaú querem ser influenciadores da quebrada
Inspiração está no próprio bairro, onde vizinho tem página de frases motivacionais com quase um milhão de seguidores
Há três meses, vizinhos do Jardim Itajaí se reuniram para fazer gravações de vídeos de cenas cotidianas e postar no Instagram. Contam com a ajuda dos conhecidos para aumentar o engajamento. Algumas produções deram muito certo, com milhares de visualizações. A meta é viver da internet, como um o jovem que administra página de mensagens motivacionais, com quase 1 milhão de seguidores.
Já virou rotina: aos domingos, próximo ao ponto final da linha Jardim Itajaí, zona sul de São Paulo, a vizinhança sai às janelas, varandas e ruas para ver manos e minas interpretando e filmando com celular cenas cotidianas, como enquadros policiais. Vão postar no Instagram, querem ser influenciadores da quebrada.
São pelo menos três perfis e vários chegados em torno de uma ideia que surgiu na garagem de Denílson Góes Souza, o “Beleza”. A garagem é parada obrigatória para conversas, churrascos e ideias – há três meses, depois de baterem uma laje, pensaram: por que não sermos influenciadores?
“Já tem gente de fora vendo, está virando”, diz Beleza, apelido que vem do pai, dono da casa com a garagem que reúne os jovens, quase todos motoboys. Beleza, por exemplo, faz entregas de dia e, à noite, realiza o mesmo trabalho em uma pizzaria da região.
Durante a entrevista, vão parando motos do lado de fora da garagem. Pelo menos vinte manos e minas encostam para ver o movimento. “A gente cola aqui desde que era portão de madeira e rua de terra”, diz Kaike da Silva Lima, 24 anos, que, invariavelmente, faz o personagem do policial nos vídeos gravados nas ruas do Jardim Itajaí.
Aprendendo a usar as redes sociais
Nos últimos três meses, os manos têm mantido o propósito: gravação no domingo e postagem à noite, além de quarta-feira, sempre às 19 horas. Larissa Peres, 19 anos, explica que “sete horas é quando o pessoal está saindo do trampo e pega o celular. E quarta tem jogo”.
Quanto aos domingos, Allyson Gabriel diz que “geral está reunida em casa, com o celular na mão, dá um engajamento violento”. Eles sentiram a sensação de viralizar, com um vídeo que bateu 260 mil visualizações.
Dois ou três celulares são usados para filmagem, edição e postagem. Os gastos de produção com cacetete e pistola de plástico, algema de brinquedo, colete e alguns pequenos acessórias, como calcinhas para uma cena, custaram cerca de R$ 250,00.
Weverton Almeida, 24 anos, filma e edita. Sonha em fazer curso cinema. “Queremos fazer algo diferente e profissionalizar isso. Não queremos fazer um vídeo, mas o vídeo”, resume.
Estratégias de engajamento
As ideias de roteiro são discutidas durante a semana em intensas trocas de mensagens, mas o improviso corre solto. Na hora de gravar, seriedade e diversão para os manos e para a vizinhança, que se acostumou com as filmagens aos domingos, um lazer.
Os vídeos são baseados em situações cotidianas, com um pouco de humor. A estratégia é postar e incentivar a galera a curtir, replicar. Estão fazendo vaquinha para pagar prêmio de R$ 50,00 para quem impulsionar o compartilhamento.
O próximo passo é colocarem o conteúdo no Youtube. O sonho é viver como influenciador “se Deus quiser, né, mano”, acredita Leandro da Silva, 24 anos.
Chegando a um milhão de seguidores
Uma das inspirações dos candidatos a influenciadores está no próprio bairro. É Gabriel Augusto Moreira Ribeiro, 29 anos. Ele tem uma página de frases motivacionais no Instagram que está prestes a atingir um milhão de seguidores. “Só criei porque sempre gostei de frases positivas, mas nunca imaginei que ia dar uma repercussão dessas”, conta.
O perfil foi criado em 2018. Antes disso, a vida de Gabriel não foi fácil. Estudou em escola pública e não concluiu a formação. Com doze anos, começou a trabalhar fazendo malabares nas ruas. Também vendeu rosas, água.
Em 2020, começou a perceber que poderia viver do engajamento da página. Faz anúncios para pizzarias, dentistas, lojas. Cobra R$ 500,00 por uma postagem no feed e R$ 200,00 para inserção em três stories. “Dá pra viver”, diz Gabriel.
O influenciador está na contramão da tendência de apostas virtuais e do famoso “jogo do tigrinho”, que recruta perfis com muitos seguidores.
“Tigrinho a gente não divulga porque atrasa muito o lado dos nossos clientes. Para nós, seria bom, para ganhar dinheiro, mas para quem está jogando, a tendência é perder”, diz Gabriel, que prepara uma festa para quando atingir um milhão de seguidores.
"Falta pouco, vou comemorar, não é todo dia que nós faz um milhão, né?”.