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Entrevista - Marcos Bernstein |
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Continuação
Joice Bruhn
- Trabalho em televisão e também escrevo roteiros. Então sei que, às vezes,
a gente usa de determinados artifícios para encaminhar a historia de uma
forma que agrade as pessoas. Você fez o mesmo com Central do Brasil?
Marcos Bernstein - O filme foi feito
com sinceridade e emoção. É isso que passa para a maioria das pessoas.
Escrever é fazer escolhas. Algumas poderiam ser mais ou menos dramáticas.
Procuramos alternar emoção com humor (se ri bastante no filme!), mas sempre
tentando contar a estória da maneira mais envolvente e sincera.
É difícil falar assim genericamente, mas eu não diria que usamos artifícios.
Por exemplo, poderíamos ter feito a relação de Dora e Josué, uma relação
mãe-filho, que arrancaria lágrimas quando eles se abraçassem e Josué dissesse
para Dora "Você agora é minha mãe!". Optamos por criar uma relação de
amigos, onde um ser humano influi fundamentalmente na vida do outro. Outro
exemplo, apesar da carga emocional da carta final de Dora, é que
eles não se reúnem no final... Será que respondi?
André Guimarães - Como você vê o mercado para roteiristas no
Brasil?
Marcos Bernstein:
Depende da área. Para TV, há um mercado razoável. Sempre é difícil começar,
mas quando se fura a barreira inicial, a remuneração é decente, podendo
chegar a muito dinheiro. Infelizmente, André, quanto ao cinema, eu nem
chamaria de mercado. São muito poucos os que podem viver só de
cinema. Mais de 5, talvez menos de 10. Os outros sempre têm fontes de
remuneração paralela.
Esse ano a situação parece ainda pior. Mas eu não quero desestimular ninguém.
No ano em que comecei, o Plano Collor ainda mostrava seu efeito devastador
na produção de cinema. Creio que nenhum longa tenha sido feito em 92.
Às vezes, o melhor momento para aprender e se desenvolver é o de crise,
pois quando vier a bonança você vai estar pronto e na posição de usufruí-la.
Gustavo César - Maceió - Tenho 12 anos. Pretendo ser ator, diretor
e roteirista de cinema e quero saber se você no início da carreira sofreu
para encontrar mercado, pois eram produzidos poucos filmes.
Marcos Bernstein - Acho que eu respondi
um pouco sua pergunta na resposta anterior. Quando eu comecei não existia
mercado. Mas como eu era mão-de-obra barata (assistente, estagiário) consegui
participar de bons projetos de TV e da preparação de futuros projetos.
Fui aprendendo e descobrindo o que realmente queria fazer.
Agora, se você está
falando de outro mercado, quero deixar claro, que, em qualquer circunstância,
com muitos ou poucos filmes, o único mercado real de roteirista de cinema
é o de roteirista contratado. Não existe mercado para escrever seu roteiro
e depois sair procurando comprador.
Fábio Yamaji - São Paulo:
Você roteirizou o livro "O Xangô de Baker Street", de Jô Soares, que
conta uma estória em que o grande mistério é a identidade do serial killer.
Eu li o livro e sei quem é o tal. Será que o filme será interessante àqueles
que já sabem do final?
Marcos Bernstein - Eu acho que o menos
importante no Xangô é saber quem é o criminoso. O mais legal são as piadas
e situações cômicas que os crimes proporcionam. Especialmente com o Marco
Nanini refrescando as piadas que estão no livro e dando vida àquelas novas
criadas para o filme. Por isso, acho que o filme será bastante divertido
para quem já leu o livro.
J. Olímpio - Curitiba - Como é que Dora, ao resgatar Josué do
apartamento dos traficantes de crianças, consegue trancá-los por fora
- sem o uso de chaves! - e fugir sem que eles os persigam?
Se o caminhoneiro (Othon Bastos) e o dono do armazém nordestino são identificados
como evangélicos, como se explica a presença de imagens de Jesus e Maria
(no painel do caminhão e na parede do armazém), sabendo-se que esse costume
é exclusivo dos católicos? Gratíssimo por sua atenção e paciência!
Marcos Bernstein - Faz mais de um ano
que não vejo o filme, mas me parece que ela tranca a porta interna do
corredor. Eles ficam presos do corredor para dentro. Pelo menos era isso
que estava no roteiro.
Quanto às imagens, isso é uma pergunta a ser feita à direção de arte do
filme e ao diretor. Nós roteiristas criamos o personagem evangélico num
caminhão com adesivos e dizeres evangélicos. Isso era suficiente para
caracterizar o personagem no papel. O resto é deles. No armazém, idem.
Acho, porém, que nem tanta gente assim sabe que as imagens são costume
exclusivo dos católicos. De qualquer modo, acho que está bem caracterizado.
Daniela Cristine da Silva - Fiquei sabendo que a Miramax, que
é a porta-voz do filme A vida é bela, está fazendo um super lobby para
derrubar o nosso filme brasileiro. Já houve até mesmo uma denúncia por
parte da revista NY. Você acha que isso pode nos atrapalhar? Ganhar um
oscar de melhor filme estrangeiro vai tornar o nosso filme melhor do que
ele é???
Marcos Bernstein: Não acho que a Miramax
faça campanha contra o nosso filme. Até porque o Central também é um filme
deles, pois eles tinham os direitos em vários países. A Miramax faz campanha
a favor do outro filme deles e não contra o nosso.
Claro que o marketing é fundamental, mas nesse momento o que importa é
que quem vota goste ou não do nosso filme. Até porque para filme estrangeiro
só vota quem viu os cinco candidatos. E não acho que o Oscar torne o filme
melhor ou pior. Nenhum prêmio torna um filme melhor. É ao contrário. Ele
ganha prêmios porque é bom. Dito isso, Deus queira que a gente ganhe esses
Oscarzinhos...
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