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Assim, para fazer X-Men funcionar para o público brasileiro (e, de modo geral, para o público não-norte-americano), o roteiro teria que perder algum tempo montando o mito, e a direção teria que despender um bom esforço para dar a esse mito toda a transcendência que a história dos mutantes merece. Para alívio de todos, e sem abrir mão da felicidade geral dos fãs, roteirista (David Hayter) e diretor tiveram esse cuidado, escolheram um belo elenco e fizeram um bom filme para os amantes da aventura, dos efeitos especiais e das belas mutantes. AGORA COM MAIS CALMA A abertura do filme é impressionante, levando-nos a um campo de concentração nazista durante a II Guerra Mundial e apresentando-nos Magneto, em sua infância, separado dos pais à força e experimentando o mais cruel de todos os preconceitos já criados pela humanidade. Assim como a Alemanha decidiu, sob a liderança de um louco, que os judeus não mereciam viver, pois seria "diferentes" e "inferiores" à raça ariana, os grandes líderes do mundo, em X-Men, estão decidindo se os mutantes podem ser tolerados, ou devem enfrentar um novo holocausto. A partir daí, sempre misturadas com toneladas de ação e belas imagens, o filme encaminha algumas reflexões interessantes sobre "o outro". Ou "outros", porque os mutantes estão divididos entre um líder racional, o Professor Xavier, que acredita numa convivência com os humanos, e um vilão clássico, Magneto, que pretende começar uma guerra. É claro que essas reflexões não chegam a se aprofundar muito, e há toda sorte de simplificações, conduzindo à velha batalha do bem contra o mal (trata-se de histórias-em-quadrinhos e cinema, e não de um tratado de Sociologia), mas esse pano de fundo, erguido com cuidado, dá a necessária dramaticidade à história e contribui para que acreditemos nos personagens. A escolha de bons atores também ajuda muito. Patrick Stewart e Ian McKellen, no alto de suas carreiras bem sucedidas, dão conta do recado, como era de se esperar, mas a grande surpresa é a atuação de Hugh Jackman como Wolverine, o X-Men que está se juntando à equipe. O personagem é complicado, porque precisa misturar selvageria, um senso ético primitivo, desorientação (não lembra nada de sua infância) e uma dor terrível, cada vez que usa suas garras. Jackman está perfeito. Anna Paquin, como Vampira, tenta acompanhar o pique de Jackman, com resultados irregulares. O roteiro lhe dá boas oportunidades para construir um personagem forte e decisivo para a história; ela, contudo, está sempre eclipsada pelas outras mulheres da tela, com seus figurinos mais impressionantes e seus poderes mais explícitos. Provavelmente o diretor queria mostrar uma adolescente se transformando em mulher (e aqueles cabelos brancos no final confirmam minha tese), mas Paquin já parece adulta demais desde o começo da história. De qualquer maneira, ela não compromete o todo do elenco, sempre homogêneo e convincente. X-Men está fazendo um merecido sucesso de bilheteria nos Estados Unidos, e provavelmente encontrará seu público aqui no Brasil, levado pela promessa de muitos efeitos-especiais, pancadaria e cenários exóticos. É bom lembrar, contudo, que essa receita, se não estiver apoiada numa dramaturgia sólida, desmancha no ar logo após a primeira sessão. O filme de Bryan Singer se sustenta por motivos cinematográficos (e não exclusivamente plásticos) e por isso é um bom filme. Minha esperança é que, um dia, um diretor esperto como Bryan Singer, e com mais tenacidade que Terry Gillian, enfrente o desafio supremo: adaptar "Watchmen" para o cinema. Aí, sim, veremos se as histórias-em-quadrinhos, com o indiscutível valor estético e a temática adulta de Alan Moore, poderão nos proporcionar uma verdadeira obra-prima. X-Men (EUA, 2000). De Bryan Singer
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