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Aprenda a decifrar os sinais

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É mesmo muito difícil atravessar essa soleira e entrar. Mesmo para pessoas mais sensíveis, mais versadas nas práticas místicas, não é sempre que as coisas ocorrem como se gostaria. Algumas vezes, a passagem não se dá com tranqüilidade, algumas vezes, por mais concentração e boa vontade que se invista, ela não se dá mesmo, de jeito nenhum. Complicado ler o que não está nas linhas, nem nas entrelinhas; algo acomodado em regiões mais sutis, além da separação habitual e corriqueira que encontramos. Decididamente, decifrar sinais é uma arte difícil.

Os sinais são, muitas vezes, impiedosos, vingativos, extremamente cruéis. Decodificá-los demanda flexibilidade e paciência, minúcia e concentração. Eles podem nos atrapalhar, nos enredar em futilidades, fazer-nos girar no vazio, sem que consigamos entendê-los como deveríamos. Como disse o poeta Fernando Pessoa, “não basta ter a vista clara, é preciso ter clara também a alma”.

Na maioria das vezes, os sinais desfrutam da liberdade dos pássaros, infinita, desregrada, como uma revoada de andorinhas. Como utilizá-los? O que fazer? Boas perguntas. Para manter o tom esotérico (o único que funciona diante dessas questões), com bondade devemos ouvi-los, buscando reconciliação através da doçura na aproximação.

A indagação, cheia de angústia, foi-me trazida pelo meu cliente AF. Num período importante da vida dele, mês de transformações, ele encontrava, nas situações mais inesperadas, pessoas desconhecidas que portavam necessidades especiais. A cabeça dele totalmente amarrada aos seus (pequenos) problemas e, na lanchonete, a criança com paralisia cerebral; na fila do banco, o cego; no parquinho, o portador de síndrome de Down. Contrastando com suas preocupações, um bocadinho egoístas e individualistas, uma porção de gente corajosa, levando adiante, com força e determinação, suas vidas recheadas de desafios. Ele notou a freqüência desses "encontros", bem acima do probabilisticamente esperado e, consultando-me, pediu esclarecimento. Simples: mensagens.

Há alguns dias acompanhei pela TV um documentário apresentando o irreverente grupo musical Mamonas Assassinas: garotos bem-humorados, fina tradução da coisa brasileira da época, ginga cheia de paródia, musicalmente redondinhos, otimismo e diversão aos galões. Após sucesso flamejante, a tragédia, cheia — como todas — de azares inexplicáveis. O que mais chamou atenção? O comentário feito, poucas horas antes do acidente, por um dos músicos, Júlio. Gravado em vídeo amador pelo irmão cabeleireiro, nitidamente incomodado, explica que no sonho daquela última noite vira a queda do avião. Decididamente, decifrar sinais é uma arte difícil. E lidar com essa decifração é ainda mais.

Marina Gold/Especial para o Terra

 
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