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No Novo testamento encontramos uma passagem interessante, fortemente espiritualizada e ilustrativa de uma idéia que merece atenção. Jesus, depois de morrer na cruz, é sepultado. A primeira pessoa a visitar o túmulo, bem cedo na manhã seguinte, é Maria Madalena. Sem imaginar que poderia encontrá-lo ressuscitado, fica desolada ao ver vazio o sepulcro e começa a chorar. Então Jesus, sem que ela o reconhecesse, se aproxima e chama: "Maria!". Identificando-o finalmente, ela, querendo abraçá-lo, se lança em sua direção exclamando comovida: "Mestre!". Ele, recuando, exige: "Não me toques" (em latim a frase é "nola me tangere", forma como esse curto, porém intenso episódio, fica conhecido).

Vamos refletir um pouquinho sobre o sentido simbólico da cena descrita por São João (capítulo 20, versículos 11-18). Inicialmente, observemos que Maria Madalena, dona de uma história pregressa fortíssima, representa, no contexto do Evangelho, uma das personagens de maior imanência e caráter terreno. É esse abraço, exatamente, que Jesus, agora levantado dos mortos, afasta. É como se deixasse claro que, em certo sentido, não está mais interessado pelas coisas daqui, ultrapassou a forma humana que adotou para reinar soberano. Ele mesmo havia afirmado: "meu Reino não é deste mundo", e agora se prepara para lá ingressar.

Uma lição que podemos aprender com São João? As coisas que precisam ser feitas por aqui — abraços, palavras, ajudas, gestos etc. —, só podem mesmo ser feitas por aqui. Nesse sentido é preciso fazê-las já, sem postergação, sem relutância. Para todas as coisas que precisamos fazer por aqui, como diziam os sábios latinos, "já é sempre tarde". Adiar, hábito generalizado entre nós, revela fraqueza humana que deve ser educada e contornada.

Mas atenção, isso não quer dizer que não devemos aprender atenciosamente a, como a sabedoria popular diz, "dar tempo ao tempo". Também não é conveniente sair desvairadamente, em desabalada carreira, acreditando que tudo era para ontem e que não sobrará tempo algum para a montanha de coisas que esperam pela nossa dedicação. É difícil mesmo equilibrar todas essas solicitações. Complicação que vamos aprendendo a domar melhor na medida em que, sempre pacientemente, amadurecemos.

Nas nossas vidas bem modernas, são muitas as solicitações e compromissos urgentes. Torna-se, por isso mesmo, necessário aprender a dizer não e organizar inteligentemente algumas coisas: estabelecer prazos sensatos e possíveis de serem cumpridos, programar-se diante da riqueza de tarefas, identificar o que é fundamental, organizar prioridades e, sobretudo, não avançar com pressa insana e contra-produtiva, algumas vezes até mesmo perigosa.

Marina Gold/Especial para o Terra

 
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