Floresça junto com a primavera
Equilibrar. Esse é o primeiro e mais importante mandamento nesses dias de fúria. É fácil? Não, não mesmo. É o maior dos desafios. Na minha longa vivência das coisas espirituais, pude, com notável freqüência, perceber como tudo conspira - a realidade bruta, os acontecimentos imprevisíveis, os detalhes incontroláveis das coisas humanas, a explosiva heterogeneidade das pessoas. Por todos os lados, no orçamento, antagonismos profissionais, amor, questões de família, saúde, a brecha está sempre pronta a se abrir e, por ela, nosso almejado e cultivado equilíbrio vai por água abaixo. É desesperador, mas ficar desesperado não leva a nada produtivo. Passo inicial é perceber que a baliza a orientar nossas trajetórias deve ser, sempre, a da modéstia e da humildade. Após entender essa demanda inicial, compreender: equilibrar é lição que constantemente exige repetição, uma repetição que deixe a inteligência de prontidão, bem treinada e vigilante. Equilibrar na meninice, na adolescência, na maturidade, depois e sempre. Equilibrar em presença dos problemas, dos empecilhos, dúvidas, hesitações, angústias, perplexidades. Equilibrar quando for derrotado - pois nenhum estrago é definitivo, frente às aptidões de motivação e superação que carregamos - e, mais difícil, equilibrar também nas vitórias, pequenas ou grandes, já que quase sempre são provisórias. Se a vida foge ao controle, se ela degringola mais e mais, se o sentido dela escapa e nos deixa atônitos, mais é urgente fazer o elogio do equilíbrio, pôr em prática a prudência, fortalecer a constância e desenvolver a serenidade em cada momento, obstáculo superado, barreira transposta, embaraço, impedimento, estorvo. Assim, o sábio opta pelo trajeto virtuoso, sem exageros de prepotência ou de submissão. Ele desenvolve, progressivamente, sua capacidade de controle e tolerância diante das injúrias oriundas da fortuna: suportando, altivo, injustiças, incômodos, fraudes e passionalidades. Para tudo isso, sabe bem o homem elevado, é preciso imensa paciência e capacitada construção do equilíbrio. O modelo que nos serve de referência, infelizmente, valoriza demasiado a competição e a vitória. Promove, insistentemente, o acúmulo do excessivo em detrimento do equilíbrio coerente. Não é de se estranhar que encontremos por aí tanta contrariedade e conflito, impedindo ou, pelo menos, dificultando muito o crescimento psicológico e espiritual dos indivíduos. Nesses dias de entrada da primavera - a mais bonita e menos cruel das estações -, vamos olhar para isso tudo com carinho e, pelas manhãs agradáveis que logo desfrutaremos, buscar algo tão fundamental, simples e trabalhoso ao mesmo tempo: equilibrar.
Marina Gold/Especial para o Terra
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