Troque as ilusões por uma vida modesta
Nesse domingo, no Dia das Crianças, todos os meios de comunicação insistiram em pedir para que recompensássemos a garotada com presentes. O estímulo para presenteá-las foi direcionado até para quem ainda não é pai ou mãe: "Premie aquela criança que você leva dentro de si!", repete a mídia exaustivamente (nessa e em outras datas especiais). É pena, nem é preciso ser muito sensível para compreender isso, que a verdadeira importância da comemoração passa longe do consumo e dos presentes. O caminho do dinheiro e da inundação de bens materiais cada vez mais triviais é frívolo e vulgar, inerte e vazio, conduz apenas ao esquecimento de quem somos, de quem são nossos semelhantes e de quais compromissos devemos assumir nessa existência. A tirania do comércio aprisiona a solidariedade, a simplicidade e a criatividade humana e impede que se cultive a alma e a espiritualidade. Por isso, precisamos reagir, nos opor aos apelos e apegos do consumo e da uniformização da vida. Frágil aspiração? Talvez. Mas, vale a pena almejar. A rota deve ser corrigida. Novos sonhos podem e devem ser sonhados. Está ao nosso alcance fazer com que o talento vença a esterilidade e com que as situações econômica, psicológica e espiritual melhorem. A riqueza nunca falou tão alto no mundo, mas será esse um mundo próspero? Um mundo no qual as pessoas se realizam? Não seria melhor trocar as ilusões mal empacotadas, correntemente à venda nas hipnóticas telas faiscantes, por uma vida mais modesta, porém voltada para a cultura e a liberdade? Por uma vida que ofereça, para além do trabalho e do consumo, uma oportunidade de existência mais plena, espiritualmente recompensadora? Por uma vida apoiada em outra ordem, idéias e ideais, reservas de valor e acumulações? Por esse outro caminho, quem sabe, o melhor do espírito humano possa ser promovido: um espírito enobrecido, que apresente às nossas crianças (queridas crianças recém-festejadas e que, no contexto atual, parecem um pouco cansadas e confusas) coisas definitivamente importantes. Para elas, então, os presentes chegariam nas mais variadas formas de fazer e de sentir; nas convicções e vínculos que bem embasam e propiciam sentido mais luminoso à vida.
Marina Gold/Especial para o Terra
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