Sydney - Esquivar-se da fama e da pressão. Esta será a tática que o judoca peso-leve Tiago Camilo vai adotar até 2004 para mudar a escrita olímpica do judô brasileiro. Desde 1988, em Seul, a surpresa da Olimpíada anterior se transforma em frustração na edição seguinte.
Dono de uma medalha de prata com apenas 18 anos, Camilo busca o ouro em Atenas para ser a exceção da regra, mas não demonstra muita preocupação.
Conhecido como "geladeira", Tiago Henrique de Oliveira Camilo tem uma fórmula simples para não se abalar com a pressão. "É só se esquivar e manter a tranqüilidade", afirmou o judoca um dia depois de sua conquista. "O importante é ficar bem comigo." Por enquanto, o menino deseja apenas comemorar a medalha e torcer para não sair de Sydney como único judoca premiado.
"O judô brasileiro vai sair com mais medalhas da Olimpíada, porque muitos estão no seu auge", aposta Camilo. "Vou ficar e dar força para os outros." Segundo ele, o mais importante é a concentração. "Tem de estar concentrado o tempo todo e não vacilar, porque no judô tudo acontece muito rápido."
Foi assim, aliás, que o garoto brasileiro conseguiu chegar numa final, deixando para trás alguns favoritos.
Em todas as lutas, Tiago saiu atrás e conseguiu se recuperar com golpes precisos nos últimos segundos. "Os caras entraram com tudo e deixei eles cansarem", conta o judoca, com a medalha no peito e um hematoma embaixo do queixo. Nesse momento de definição, segundo ele, chega a hora da técnica. "A força sempre acaba e então você precisa aproveitar para dar o golpe final."
A estratégia só não funcionou na última luta, acredita Camilo, porque o seu adversário, o italiano Giuseppe Maddaloni, já sabia de sua estratégia. Quando o brasileiro tentou seu golpe mortal, o uchimata, Maddaloni conseguiu se esquivar. "Quando você dá um golpe desses, ou o cara cai ou você vai para o chão, porque na velocidade que vai a perna não tem jeito de voltar", explicou o atleta.
“Na verdade, eu mesmo me dei um ippon", brinca. Apesar de ficar muito irritado na hora, o "geladeira" já estava em seu estado normal no dia seguinte. Tem sido assim desde que, aos cinco anos, perdia na corrida para o seu irmão, Luiz Francisco, três anos mais velho. "Ficava bravo, chorava muito e meu pai, então, pedia ao eu irmão para me deixar ganhar na próxima", lembra Camilo. Francisco obedecia e Tiago sentia-se um vencedor sem saber da trama.
Dois anos depois, quando decidiu entrar no judô, ele continuava em desvantagem cronológica, mas já não podia mais contar com aquele tipo de ajuda.
"Não havia categoria abaixo dos dez anos e o jeito lutar com meninos mais velhos", recorda o judoca.
"Mesmo assim eu já ganhava algumas lutas." Ganhou tanto que acabou campeão mundial júnior, em Cali (meio-leve) e campeão mundial da Juventude, em Moscou (leve), em 1998, além de campeão pan-americano (meio-médio), em 1999. Sua trajetória é tão precoce que ele ainda pode disputar e ganhar tanto os campeonatos júnior e sênior no próximo ano.
Nessas competições, Tiago pretende mostrar que não será mais um judoca a sofrer com a maldição da medalha. Até agora, ninguém escapou. Douglas Vieira (prata em 1984), Aurélio Miguel (ouro em 1988), Rogério Sampaio (ouro em 1992) e Henrique Guimarães (bronze em 1996) não repetiram o sucesso nos Jogos seguintes. A exceção foi Miguel, que assim mesmo teve de se contentar com o bronze oito anos após levar o ouro.
Camilo lamenta, mas acha que pode reescrever essa história. Ele só não quer pensar na possibilidade de enfrentar o seu irmão, também atleta de judô. "Deve ser fogo lutar contra irmão", imagina. Tiago só tem certeza de que, desta vez, não precisará do "incentivo" paterno.