Sydney - A vitória de Cathy Freeman nos 400 metros rasos da Olimpíada de Sydney, que valeu a centésima medalha de ouro para a Austrália na história das Olimpíadas, mexeu com todo o país. Em clima de Copa do Mundo de futebol, os australianos leram, ouviram e viram relatos durante todo o dia sobre a nova heroína olímpica. A folga na programação do torneio de atletismo serviu para reverenciar feito da atleta, que fez questão de comemorar o título com as bandeiras australiana e aborígine, povo do qual descende.
A decisão de Cathy de homenagear o seu povo não foi a primeira. Há seis anos, nos Jogos da Comunidade Britânica, no Canadá, ela teve a mesma atitude e foi duramente criticada pelas autoridades australianas, que lutam contra processos de líderes aborígines que reivindicam longas extensões de terra, alegando que seus ancestrais vivem no continente há mais de 40 mil anos, ou seja, bem antes do início da colonização inglesa, que começou em 1780.
Desta vez, porém, a comemoração de Cathy só mereceu elogios. O primeiro-ministro John Howard, que convive com o pesadelo de protestos no país, disse nesta terça-feira ter achado "ótima" a iniciativa da corredora, que disputará ainda as provas dos 200 metros rasos e do revezamento 4 x 400 metros na Olimpíada. "Nunca tive receio sobre isso, pois entendo que ela está orgulhosa por ser aborígine e por ser australiana", declarou a uma emissora de rádio local.
Cathy Freeman, a primeira aborígine a integrar uma equipe olímpica australiana, a conquistar um título mundial e, agora, um título olímpico, sempre que pode defende os direitos de seu povo e encampa lutas por igualdade de tratamento. Recentemente, classificou como "insensibilidade" a decisão de Howard de recusar um pedido de desculpas pelos problemas enfrentados por seu povo.
Para Howard, a atitude de Cathy foi "natural". "Ela é um exemplo a ser seguido pela juventude australiana, tanto pelos aborígines quanto pelos outros", afirmou o primeiro-ministro. "Acho que todos ficaram muitos felizes e esta Olimpíada diminuiu as diferenças e deixou os australianos mais próximos." Os aborígines formam cerca de 2% da população de quase 20 milhões de habitantes da Austrália. As populações nativas vivem nas regiões mais inóspitas do país e contam com pouco apoio do governo. Um reflexo disso é que a expectativa de vida de um aborígine é 20 anos menor do que a de um australiano.