Porto Alegre - Eles são chamados pelo Comitê Paraolímpico Brasileiro de gigantes. São os atletas de melhor currículo, aqueles nos quais estão colocadas as maiores esperanças de conquista de ouro em Sydney. Um desses gigantes luta judô, tem 29 anos, é alto, forte, cara simpática e atende pelo nome de Antônio Tenório da Silva.
Não é sem razão que foi escolhido gigante. Antônio Tenório é dono de uma das duas únicas medalhas de ouro que o país conquistou na Paraolimpíada de Atlanta-1996 e tem boas condições de brigar por mais um ouro, agora na categoria até 90 quilos.
Não foi só no peso que cresceu. Fernando da Cruz, seu treinador, garante que o judoca está mais experiente. A confiança, nesse caso, parece ser total e mútua. Antônio Tenório deixa clara sua fé no técnico quando descreve a última etapa de treinamento.
"Pela manhã, pratico judô, e à tarde faço academia. Agora o professor Cruz vai conversar comigo sobre os adversários. Vai me dizer onde devo entrar, quais os pontos fracos dos outros. Ele sabe tudo sobre isso", disse.
O medalhista de ouro em Atlanta sabe tudo sobre a luta no tatame, um dos esportes nos quais o Brasil tem boa tradição. Mas houve tempo em que sabia muito menos da vida e acabou sem querer por complicá-la. Filho de um guarda da Volkswagen, em São Bernardo do Campo, começou no judô aos oito anos. Antônio Tenório perdeu a primeira vista numa brincadeira. Moleque de 14 anos, estava em plena guerra de mamonas, munido de um bom estilingue. Tiro para lá e para cá, acabou sendo vítima do disparo certeiro de um “inimigo”. Mas nem por isso desistiu do judô.
Continuou competindo entre os normais, ou chamados videntes. Foi aos 19 anos que sofreu o grande baque, e desta vez não houve imprudência. Uma infecção alérgica no outro olho provocou um descolamento de retina.
O impacto foi grande, lembra o campeão olímpico. A vida parou por muitos meses, por mais de ano, até que Antônio Tenório concluiu que o médico o estava enrolando e decidiu voltar ao judô. Nesse momento, estava riscando definitivamente os traços de seu destino. Mesmo com a deficiência visual, seguiu competindo como se não a tivesse. Foi num desses campeonatos, em São Paulo, que acabou descoberto. O professor Cruz lá estava à procura de talentos e ficou impressionado com a performance de Antônio Tenório. Mais impressionado ainda quando viu, ao final da luta, o jovem lutador se retirar do tatame auxiliado por uma criança, seu sobrinho. Cruz soube, então, de seu problema e se tornou treinador do futuro campeão.
Antônio Tenório pegou o caminho, como gosta de dizer. É um judoca bem conceituado, que baseia sua atividade no apoio do Vasco e do Instituto Brasileiro de Defesa ao Deficiente. Na rota do ouro em Sydney terá encontros perigosos. A estratégia de vencer as três primeiras lutas tem que ser muito boa para superar judocas da Austrália, do Japão e da Inglaterra, considerados os mais difíceis. Mas ele pode. O pai de Anderson, 10, e de
Alexsandro, 11, espera entrar na casa dos 30 anos, que vai completar no dia 24, comemorando as conquistas do dia 21, quando irá à luta. Todos torcem por ele e pelos outros 63 companheiros que estão começando a corrida pelo ouro em Sydney.