Como prometido, a coluna abre espaço para
a mais brasileira das jogadoras argentinas, Karina. A pivô do Jundiaí/Quaker
foi criticada aqui pelo ex-jogador Marcelo Chagas, que hoje mora
na cidade paulista. Ele condenou a maneira como ela administra e
atua pela equipe, em carta que foi divulgada na coluna "Reação mexicana".
Segundo Karina, em entrevista por telefone,
Marcelo Chagas, também conhecido por Mexicano, estava "muito mal
informado" pelo trabalho esportivo e social desenvolvido em Jundiaí.
"Eu e as jogadoras da equipe fomos conversar com ele, saber de onde
ele tirou tantas informações falsas. Exigimos dele uma retratação,
do contrário todas nós e o técnico Antônio Carlos Barbosa iríamos
processá-lo pelas mentiras e declarações sem provas que ele prestou",
disse.
Karina conta que mantém em Jundiaí cerca de
1.000 crianças nas escolinhas de basquete, além de uma equipe de
cadeira de rodas. "Nós somos mais do que uma equipe de basquete,
existe todo um projeto em desenvolvimento. Algo que ele não conhecia
e, por falta de informação, falou um monte de besteiras."
Criticada por estar "jogando mal", ao dividir
a função de pivô e administradora, Karina levou a Marcelo Chagas
as estatísticas do Campeonato Paulista: ela é a segunda cestinha
e também a segunda em rebotes. Sua equipe garantiu vaga na semifinal
por antecipação. "Se esses números não servem para mostrar como
estou jogando, então ele não entende nada de basquete."
A argentina naturalizada brasileira concorda
com as críticas feitas pelo ex-jogador à estrutura atual do basquete
brasileiro. "Ele tem razão quando fala de nossos dirigentes, da
falta de apoio aos clubes. Veja o caso das jogadoras do Vasco, que
estão há três meses sem receber salários. É uma situação bastante
preocupante, que não pode continuar dessa forma."
Com a experiência de quem está acostumada
a bater de porta em porta em busca de patrocinadores, Karina acha
que a única saída é a aprovação da nova lei de apoio fiscal ao esporte.
"Sem ela, os patrocinadores não vão investir. E, sem eles, não só
o basquete, mas todos os esportes irão sofrer." Ela acredita também
que já é hora de a Confederação Brasileira de Basquete fazer alguma
coisa. "O basquete está sendo muito mal-tratado pela CBB."
Karina revelou que na próxima segunda-feira
terá uma reunião com os executivos da Quaker. "Vamos decidir se
o patrocínio será mantido, se continuaremos usando Quaker ou Pepsi
(nova detentora da marca). Mas já temos duas grandes multinacionais
interessadas no nosso projeto. Afinal, temos cinco jogadoras e o
técnico da seleção nas Olimpíadas de Sydney. É um trabalho sério,
e que está dando resultado."
Com a resposta de Karina, a coluna cumpre
a sua missão de deixar um espaço democrático para a discussão dos
problemas do basquete, além de estar aberta a propostas que ajudem
o esporte. O ex-jogador Marcelo Chagas também mandou nova mensagem,
que será relatada na próxima coluna, no domingo.
Reação mexicana
Segunda, 8 de janeiro de 2001
Após
relatar o drama do início do novo século, com equipes paulistas
(Santo André e Jundiaí) sendo fechadas por falta de patrocínio,
essa coluna recebeu uma mensagem que mostra bem o drama que afeta
não os clubes, mas os jogadores, que são as maiores vítimas dessa
estrutura falida. A carta foi enviada pelo ex-jogador Marcelo Chagas,
o Mexicano. O relato abaixo é mais do que um desabafo, mas uma prova
viva da dura realidade do nosso basquete:
"(...) Já fui jogador profissional, se é que
aqui no Brasil podemos chamar os basqueteiros de profissionais,
com exceção de alguns. Mas conseguia viver do basquete. Infelizmente
rompi o tendão patelar a uma semana do início do Campeonato do México
e acabei abrindo um bar aqui na cidade de Jundiaí chamado "Café
Tequila".
"Tive técnicos como Dodi no Sírio, Edvar no
Monte Líbano, Lula no Palmeiras e Hebraica e o mestre Vlamir Marques.
Hoje, com 31 anos, continuo vendo as mesmas pessoas, os mesmos jogadores
e as mesmas trapalhadas das federações."
"O que mais me chamou a atenção da sua coluna
foi com relação à Karina, a qual é citada com sofrimento e como
uma pessoa que faz tudo pelo basquete. Com o pouco contato que tive
aqui com as jogadoras, posso assegurar que a única beneficiária
nesse vai e vem de patrocinadores é esta pivô que, para mim, pelo
fato de ser uma dirigente ao mesmo tempo, não está jogando nada
e, como administradora, diretora, técnica etc... do time de Jundiaí,
vale ressaltar que ela é péssima, péssima com as suas companheiras
também, que não podem nem abrir a boca, pois a patroa joga junto.
O Barbosa a mesma coisa, pois com a falta de times (daqui a pouco
só haverá a seleção) e de alguém que banque o seu salário, melhor
deixar o barco correr, só sei que para a cidade de Jundiaí o basquete
da Karina e seu time não trouxeram nenhum benefício."
"Quanto ao basquete masculino só posso dizer
que nem no Campeonato de Pré-Veteranos (se é que podemos chamar
de pré-veteranos jogadores de 25 anos) existe organização, espírito
esportivo e honestidade. Pois os times da capital (aqueles museus
que você chamou na sua coluna) insistem em tapetão e coisas do tipo
para prejudicar uma ou outra equipe. Cito isso porque na minha época
de juvenil, 12 anos atrás, existia e com certeza ainda existe aquela
condição de que filho de diretor, parente, conhecido etc... tem
preferência para estar na equipe. Com isso vários jogadores do interior
e mesmo da capital acabam desistindo deste esporte maravilhoso que
bem poderia estar mais dentro de cada brasileiro."
Esta aí um depoimento claro do momento crítico
de nosso basquete. Que mostra não apenas as dificuldades dos clubes,
mas, o que é muito mais importante, dos atletas. Afinal, sem eles,
o que seria de nosso esporte? Aproveito para deixar esse espaço
livre caso a jogadora Karina e o técnico Antonio Carlos Barbosa,
citados no texto, queiram dar a sua versão. Ou para alguém que tenha
alguma solução para o futuro do nosso pobre basquete.
Bryant, claro
Sexta, 5 de janeiro de 2001
O novo século
começa mal para o basquete feminino paulista. O Santo André acaba
de perder o patrocínio da Arcor e o mesmo deve acontecer com o Jundiaí,
que deve ficar sem o apoio financeiro da Quaker, a ser anunciado
na próxima semana.
Essas são as duas principais equipes do que
restou do Campeonato Paulista, que caminha cada vez mais para o
buraco. Há muito tempo que a situação é crítica, e agora não se
sabe nem se será possível realizar o torneio em 2001. Haverá times
suficientes?
Sem falar que o campeonato de 2000 ainda
não terminou. Depois das festas de fim de ano, as equipes voltam
para as disputas das semifinais, em clima de total abandono.
Afinal, as jogadoras sabem que ficarão desempregadas
em breve. Já está mais do que na hora de os dirigentes repensarem
a estrutura dos clubes. Todos eles são reféns dos patrocinadores.
Santo André vai pedir socorro à prefeitura,
que já deve ter problemas sociais demais para resolver do que sustentar
um time de basquete.
Para Karina, sem a aveia no leite, será hora
de recomeçar a velha batalha por um novo patrocinador. Aliás, é
o que mais ela tem feito nos últimos anos: fica batendo de porta
em porta das empresas em busca da sua sobrevivência. O que pode
explicar a sua queda de rendimento, já que parece não ter mesmo
tempo para treinar e se concentrar em jogar. Mal termina uma temporada,
e já tem de correr atrás de um novo time. Jundiaí e Santo André
são apenas mais duas vítimas dessa estrutura falida.
Portas fechadas
Quinta, 4 de janeiro de 2001
Afirmar que Kobe Bryant, aos 22 anos, é melhor do que
foi nessa idade Michael Jordan rendeu a essa coluna diversas críticas de internautas.
Ok, respeito a opinião contrária, mas continuo acreditando que o futuro rei da
NBA veste a camisa 8 amarela e violeta.
E foi assim, com status real, que Kobe Bryant
entrou no novo século, eleito o melhor jogador do mês de dezembro
do campeonato. Com mais de 30 pontos de média por partida e líder
entre os cestinhas, ele mereceu o prêmio.
Para comemorar a escolha, Bryant brilhou quase
que solitário na estranha vitória do Lakers sobre o Utah Jazz, na
noite de terça-feira, em Los Angeles. O jogo foi mesmo pra lá de
esquisito. Para ter uma idéia: no intervalo, o Lakers vencia por
míseros 33 a 28.
Foi um festival de erros. Até bandejas fáceis,
sem marcação, foram desperdiçadas. John Stockton e Karl Malone tiveram
uma de suas piores atuações na carreira. O Lakers conseguiu se manter
à frente do placar graças à força de Shaquille O'Neal, que dominou
o garrafão, tanto na defesa quanto no ataque. Até ser eliminado,
com seis faltas e duas técnicas, a seis minutos do final.
Com Shaq anulando as jogadas de garrafão do
Jazz, sobrou espaço para Kobe brilhar. Ele ficou, mais uma vez,
acima de sua média, com 31 pontos, e foi o responsável por duas
enterradas geniais. Na primeira, ele invadiu por baixo da cesta,
evitou a marcação de Greg Ostertag e, de costas, cravou a bola.
No final da partida, ele recebeu um passe preciso de Isaiah Rider
para um ponte aérea, qua liquidou com a última reação do time de
Salt Lake City.
Foi uma pequena, mas significante demonstração
do talento de Bryant. Gostaria de insistir: ele tem só 22 anos,
já conquistou um título de campeão, não terá mais a pressão de ter
de provar sua capacidade a cada temporada. O caminho está aberto
para o primeiro reinado deste milênio.
2001 reflexões
Sábado, 30 de dezembro de 2000
A virada do século não deve ser motivo de
comemoração para o basquete brasileiro, nem tão pouco de lamentações.
É o momento de refletir o que melhor aconteceu nos últimos anos,
e as lições que deveriam, mas não foram aprendidas.
Os mais exaltados estão vibrando com a classificação
do Brasil em quarto lugar no ranking da Fiba, em razão das 13 medalhas
(3 de ouro) em Olimpíadas e Campeonatos Mundiais.
Méritos para gente como Kanela, Wlamir, Oscar,
Paula, Hortência, Janeth... Poderiam ser muito mais, claro. Mas
o que mais chama a atenção é como o basquete brasileiro não soube,
nesses anos todos, transformar suas glórias numa estrutura capaz
de perpetuá-las e criar verdadeiras gerações de campeões.
Afinal, chegamos ao final do século como
se estivéssemos engatinhando no basquete, e não, como deveríamos
ser, uma potência internacional. Ou alguém acha que essa classificação
no ranking é capaz de assustar em competições internacionais?
Hoje, apenas a seleção feminina pode causar
medo em torneios lá fora, já que o time masculino, há algum tempo,
está longe do primeiro escalão. Também não é o caso de jogar tudo
no lixo e partir do zero.
Nada disso. O momento é de elevar o modelo
do nosso basquete, que não pode mais ser encarado como um esporte
amador. É preciso um plano de profissionalização e não apenas de
captação de patrocinadores, algo que, mais claro do que nunca, não
é a melhor saída.
O patrocínio precisa ser um complemento de
uma estrutura moderna para o século 21. Viver às custas das empresas
é um alto risco, que hoje está sendo vivido na pele principalmente
pelos clubes paulistas.
No Rio, com fartura de investimento, há maior
fôlego. Mas até quando? Mais do que um projeto para o ano 2001,
o basquete necessita, com urgência, de um plano se salvação para
o próximo século.
Do contrário, vamos continuar vivendo, e
torcendo, pelo surgimento de novas pedras preciosas. Sem elas, corremos
o risco de não ter nada para comemorar na virada de 2100.
Aproveito essa oportunidade para desejar
a todos os internautas que acompanham essa coluna muito mais do
que um feliz ano novo: feliz século novo a todos! Afinal, como diria
o amigo e colunista de Fórmula 1 Flávio Gomes, "não é todo dia que
se pode desejar um século de felicidades".
Aos Marcelos
Quinta, 28 de dezembro de 2000
Essa coluna é dedicada a dois internautas,
ambos chamados Marcelo, a quem agradeço pela audiência. Ao primeiro,
Marcelo Lewkowitz, devo mais do que um agradecimento, mas um pedido
de desculpas, por um erro grosseiro cometido na coluna "Melhor que
Jordan".
O erro, caro Marcelo, infelizmente para você,
não foi ter considerado Kobe Bryant melhor do que Michael Jordan
aos 22 anos. Uma questão polêmica, sem dúvida, mas que este colunista
não quis se posicionar em cima do muro, nem se aliar à viúvas do
rei. O erro, grave, foi quando disse que, nessa idade, Jordan ainda
era um astro universitário.
Mais uma vez, mês desculpo com o senhor Lewkowitz
e com os demais internautas. Como bem observou o atento leitor,
naquela época, em 1985, Jordan já estava no seu segundo ano como
profissional do Chicago Bulls, um ano difícil, devido à mais grave
lesão de sua carreira, com uma fratura no pé.
O internauta, que não aceita a defesa de Bryant,
lembra com precisão os primeiros números da carreira de Jordan:
média de 28.2 pontos em seu primeiro ano no Chicago, contra 22.7
no segundo, quando sofreu a contusão, mas que chegou a 43.7 nos
playoffs. Uma marca digna de um rei.
Naquela época, Jordan não tinha um time suficiente
para levá-lo ao título. Algo que Bryant soube desfrutar bem na última
temporada, ao lado de Shaquille O'Neal e do técnico Phil Jackson.
Por tudo isso, por ter conquistado um título tão cedo e pelo que
está jogando, acredito que Kobe tem, aos 22 anos, mais jogo que
Jordan na mesma idade. E uma oportunidade rara de superar, ao longo
da carreira, o próprio rei. Algo que não se encerra aqui. Pelo contrário,
será tema de muitas e muitas discussões, algo como quem foi melhor,
Pelé ou Maradona.
O outro internauta a quem gostaria de agradecer
é Marcelo Picka. Ele não concorda quando escrevi que o Vasco termina
o século como a maior potência do basquete brasileiro. Ele cita
os exemplos de Sírio, Monte Líbano e Rio Claro que, de fato, foram
grande potências, mas hoje, caro Marcelo, é preciso admitir que
não passam de peças de museu.
Foram clubes brilhantes, que conquistaram
títulos importantes, mas infelizmente não deram continuidade ao
trabalho. Algo que o Vasco se propos a fazer. Deixei claro naquela
coluna que não considero o plano vascaíno como o ideal. Afinal,
é fácil montar times fortes com dinheiro de patrocinador. O duro
é transformar isso num projeto a longo prazo, como faz brilhantemente
a cidade de Franca.
Mas essa é a realidade do nosso basquete no
final do século 20, refém de patrocinadores. O Vasco promete não
se dedicar apenas aos times de ponta, mas formar uma escola, como
faz no futebol. Todos nós torcemos para que isso possa ser uma luz
para o futuro de nosso basquete. É, no momento, o que temos de melhor.
O que não significa que seja o melhor de todo o século.
Melhor que Jordan
Quarta, 27 de dezembro de 2000
Aos
22 anos, Kobe Bryant é melhor do que Michael Jordan foi quando tinha
a mesma idade. Naquela época, início dos anos 80, o rei era apenas
um astro do basquete universitário e estava longe de conquistar
o seu primeiro título da NBA, algo que o garoto prodígio já tem.
Dizer que Kobe será melhor que Jordan, bem,
isso só será possível ao final de sua carreira, digamos, no próximo
século, em dez anos ou mais. Mas é indiscutível que seu potencial
permite acreditar que um novo rei está a caminho do trono.
Veja, são apenas 22 anos. Michael Jordan ganhou
seu primeiro título aos 28! Até chegar à idade maturidade, onde
os grandes se tornam gigantes, Bryant ainda tem seis anos pela frente.
Com potencial para superar os seis títulos de MJ.
Com dois meses da temporada 2000-2001, Kobe
já é o cestinha com quase 30 pontos de média por partida. É o maior
candidato a MVP, apesar de o Los Angeles Lakers estar longe do time
amedrontador da temporada passada. Motivo: a irregularidade causada
pela troca de jogadores. E é normal um time campeão reduzir o ritmo.
Isso aconteceu até mesmo com o Chicago Bulls de Michael Jordan.
O momento, por enquanto, é de Kobe. Nos playoffs,
será a vez dele provar se pode mesmo ser comparado ao rei, quando
terá a ajuda dos experientes Shaq e Ron Harper. Até lá, a hora é
de se deliciar com o novo astro.
Nesta temporada, Bryant passou a ter uma função
mais agressiva. Na maior parte do tempo, ele deixa de jogar como
ala-arremessador e passa a ala-de-força, mas próximo da cesta. Isso
lhe dá inúmeras oportunidades, principalmente nos rebotes e na tradicional
ponte-aérea. Ele já tem uma coleção invejável de grandes enterradas.
Como um certo Michael...
Kobe também está brilhante nos dribles. Não
é um exagero dizer que ele pode ser chamado de Garrincha do basquete.
Em seus últimos jogos, seus marcadores, muitas vezes, têm ficado
literalmente no chão. Como um certo Michael fez com Byron Russel
no memorável lance decisivo do jogo final da Era Jordan.
O brilho de Kobe acaba de lhe render o prêmio
de melhor jogador da semana. Muito pouco para quem está arrebentando.
E poderia ter sido melhor, não fosse um erro grosseiro da arbitragem
no jogo contra o Portland, na segunda-feira de Natal, quando Bryant,
com três pontos atrás, partiu para a cesta a sete segundos do final,
marcou os pontos e ainda sofreu a falta. Seria o empate, não fosse
o juiz que deu a falta de ataque. Talvez essa seja a única maneira
de parar Kobe hoje em dia. Ou como diria o juiz de futebol Oscar
Roberto Godoi, só mesmo à bala.
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