De centro da burocracia do poder à sede do levante popular no Egito em três décadas, a praça Tahrir passou a ser nome reconhecido no mundo inteiro devido à extensa cobertura da mídia internacional desde que os protestos pró-democracia do dia 25 de janeiro aumentaram e paralisaram todo o país. O jornalista brasileiro Tariq Saleh esteve no Cairo durante os dias de confrontos mais intensos e conta um pouco do que viu no coração da capital egípcia. Confira abaixo trechos do relato.
Após deixar o hotel, fui fazer um reconhecimento do "terreno", como sempre faço em qualquer lugar que eu vá. À aquela altura, os protestos já estavam em andamento. Enquanto uma grande massa protestava em frente a um grande aparato policial, em outra área se desenrolava os confrontos que mudariam o rumo do Egito nos dias seguintes.
Jovens tentavam chegar à praça Tahrir cruzando o Nilo de um lado a outro, e entraram em confrontos com as tropas de choque da polícia e partidários, em roupas civis, do partido de Mubarak. Foram pelo menos sete horas de tensões, em que a polícia avançava com veículos, lançando bombas de gás lacrimogênio e balas de borracha. Na frente deles, partidário de Mubarak lançavam pedras contra os manifestantes antigovernistas.
De uma certa distância, eu fiquei observando as cenas de batalha, até que os jovens egípcios obrigaram a polícia a recuar. Escutei uma jovem com máscara pra se proteger do gás lacrimogênio dizer a uma turma de rapazes que atiravam pedras contra as forças de segurança para que não recuassem e avançassem. Estava ali, pensei pra mim, uma disputa por território.
Um jovem egípcio passa por mim e eu pergunto onde querem chegar. "Na praça Tahrir, queremos puxar eles para fora da praça", disse ele. Achei aquilo impossível, que os manifestantes estavam se iludindo. Não se tratava apenas da praça. Mas ao redor dela, estavam importantes prédios do governo, e ruas que levavam ao Parlamento do país.
Eu voltei ao hotel porque a situação estava ficando mais tensa e perigosa. De fato, as emissoras de TV locais e internacionais começaram a dar as informações de que os manifestantes estavam avançando ao centro da capital. E cerca de cinco horas após o meu encontro com aquele jovem que queria tomar a praça Tahrir, a polícia foi retirada das ruas do Cairo, e o governo instaurou toque de recolher e enviou o exército às ruas.