Um projeto que começou tímido no Brasil em meados de 1994 e criou muita polêmica, especialmente por promover a troca de seringas usadas por novas entre usuários de drogas injetáveis, é considerado hoje um exemplo mundial de luta contra a epidemia de HIV/Aids e está sendo exportado para o Cone Sul, por intermédio da ONU."Quando começamos o programa de redução de danos encontramos inúmeras dificuldades. A própria legislação na época, dizendo que qualquer apoio à atividade do uso de drogas era crime, limitava nosso trabalho", disse Rose Munhoz, responsável pela unidade de cooperação externa da Coordenação Nacional DST/Aids.
Usando aconselhamento, recomendando serviços de saúde para testar o HIV e trocando seringas, os técnicos do Ministério da Saúde infiltraram-se entre os usuários de drogas injetáveis e conseguiram reduzir de 24, em 1994, para 12 por cento, em 2002, a proporção de pertencentes a esse grupo no total de infectados pelo HIV. Os resultados chamaram a atenção global.
"O desafio no Cone Sul (Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile), onde o projeto será aplicado, é ainda maior", diz Giovanni Quaglia, representante no Brasil do Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crime (ODC). "Na Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile a taxa de usuários infectados ronda os 40 por cento (de todos os portadores de HIV) e o apoio do governo ao combate da Aids é bastante fraco."
Nesta semana, a Organização das Nações Unidas (ONU) anunciou que investiria 1 milhão de dólares nos países que integram o Cone Sul para ampliar a experiência na prevenção do HIV/Aids ligada às drogas.
Segundo Quaglia, o programa já foi aprovado pelos governos e o dinheiro foi repassado há poucas semanas. A execução do projeto está prevista para ter início em janeiro de 2003.
"A prevenção do HIV/Aids deve ser vista como um investimento e não como um gasto extra do governo", destacou Quaglia.
No Brasil, cerca de 65 mil usuários de drogas injetáveis já foram atendidos pelo projeto, e outras populações de risco, como profissionais do sexo e presidiários, também recebem atendimento.
"Queremos pular etapas com nossos vizinhos e amenizar os obstáculos com que nos deparamos no Brasil", apontou Munhoz, acrescentando que as drogas são um problema de saúde pública que levam a consequências piores como a Aids.
"O uso de drogas em si, sejam elas ilícitas ou não, deixa as pessoas mais vulneráveis ao HIV, já que quando estão bêbadas ou drogadas esquecem-se de usar o preservativo e adotam um comportamento de risco", disse ela.
O objetivo do programa, entretanto, não é apenas bloquear o risco de um usuário de droga infectar-se com o HIV. "A meta final é fazer com que a pessoa largue a droga de vez e saia do grupo de alto risco da Aids", afirmou Quaglia.