Pesquisadores da Califórnia desenvolveram uma vacina oral capaz de bloquear o suprimento de sangue de tumores e impedir a disseminação do câncer, segundo os resultados de um estudo recente feito com camundongos.Produzida a partir de bactérias do gênero "Salmonella" geneticamente modificadas, a vacina evitou o espalhamento dos tumores em roedores com câncer. Também impediu o desenvolvimento de tumor em animais que receberam injeção de células de melanoma (câncer de pele) e de câncer de pulmão e de intestino, de acordo com o artigo publicado na edição antecipada on-line da revista Nature Medicine.
A bactéria carregava um gene de camundongo para o receptor 2 do fator de crescimento vascular-endotelial (FLK-1), proteína produzida em vasos sanguíneos recém-formados. Ao estimular o sistema imunológico dos animais a atacar as bactérias -- e consequentemente o FLK-1 -, os pesquisadores impediram a formação de novos vasos, que freqüentemente se desenvolvem para alimentar o tumor.
Ainda são necessários muitos estudos para determinar se a técnica seria segura e eficaz em humanos. Os camundongos apresentaram atraso na cicatrização, fato que não surpreendeu, segundo o artigo, pois esse processo exige a formação de novos vasos sanguíneos. Apesar disso, os roedores mantiveram fertilidade normal e pareceram não serem afetados de outra maneira pela vacina, que basicamente desencadeia neles uma reação do tipo auto-imune.
O tratamento proporciona uma maneira de atacar o câncer sem combater o tumor em si, afirmou à Reuters Health um dos autores do estudo, Ralph A. Reisfeld, do departamento de imunologia do Instituto de Pesquisa Scripps, em La Jolla (Califórnia). As células tumorais são variadas e podem escapar ao "radar" do sistema imunológico, o que faz delas uma espécie de alvo móvel, disse Reisfeld.
Estudos anteriores haviam demonstrado que os tumores crescem muito pouco se o suprimento sanguíneo for limitado, explicou o coordenador do estudo, Andreas Niethammer, pesquisador associado no Instituto Scripps. Muitas vezes, se o fornecimento de sangue é interrompido, o tumor definha até morrer, completou o cientista.
Outros pesquisadores tentaram usar medicações para bloquear o desenvolvimento de novos vasos no tumor e obtiveram resultados variáveis. Por esse motivo, a equipe de Niethammer decidiu recrutar o próprio sistema imunológico para impedir esse crescimento. Descobriram ser possível enganar o sistema imunológico para que atacasse a formação vascular caso conseguissem fazer as células T "assassinas" (killer) confundir as células dos novos vasos com invasores, explicou Reisfeld. No trabalho, os cientistas usaram uma cepa não-patogênica da bactéria "Salmonella typhimurium", frequentemente associada à intoxicação alimentar.
Os efeitos da vacina foram duradouros. Dez meses após a vacinação, camundongos que receberam injeção de células cancerosas não apresentaram desenvolvimento de tumores, constataram os cientistas.
Embora os resultados sejam promissores, Reisfeld adverte que há um longo caminho a percorrer antes que a vacina se transforme num tratamento para humanos. "É preciso lembrar que um camundongo não é um ser humano", disse o pesquisador. "Tratamentos que funcionam nesses roedores nem sempre podem ser transformados em terapias para seres humanos."