Há muito tempo, os pesquisadores sabem que as pessoas infectadas por uma determinada cepa da bactéria "Helicobacter pylori" são mais propensas a desenvolver úlceras e câncer de estômago - embora nem todos os portadores do microrganismo venham a apresentar esse tipo de câncer. Também não é de hoje que os cientistas tentam descobrir se o motivo dessa diferença se deve à constituição genética do paciente ou à cepa da bactéria.Agora, os resultados de um novo estudo sugerem que tanto as diferenças genéticas dos infectados quanto a cepa da "H. pylori" influenciam o risco de desenvolver o câncer gástrico.
"A resposta é ambas", disse Martin J. Blaser, da Universidade de Nova York e do Centro Médico New York Harbor Veterans Affairs, ambos em Nova York, em entrevista à Reuters Health. "Ambos os fatores são verdadeiros e importantes", acrescentou o especialista, que escreveu um editorial sobre a pesquisa.
No trabalho, a equipe de Ceu Figueiredo, da Universidade do Porto, em Portugal, constatou que as pessoas infectadas por uma determinada cepa da "H. pylori" e que, ao mesmo tempo, eram portadoras de uma variação genética foram mais propensas a desenvolver câncer de estômago do que os pacientes que apresentavam apenas a mutação ou tinham infecção pela cepa mais virulenta da bactéria - mas não apresentavam ambas os fatores concomitantemente.
Os dois fatores provocam um aumento do risco de desenvolver câncer de estômago, afirmaram os autores na edição de 20 de novembro do Journal of the National Cancer Institute. As pessoas infectadas pela cepa "mais perigosa" da "H. pylori" e portadoras da variação genética foram quase 90 por cento mais propensas a ter câncer de estômago, em comparação com os pacientes sem a variação genética e infectados por uma cepa menos agressiva da bactéria.
De acordo com os pesquisadores, essas conclusões poderão ser usadas para indicar quais pacientes infectados pela "H. pylori" têm risco maior de apresentar tumor de estômago e também aqueles que se beneficiariam de um acompanhamento médico mais intensivo e do uso de antibióticos para eliminar a bactéria.
"Na nossa opinião, caso nossos resultados sejam confirmados por outros estudos, os portadores de polimorfismos e infectados por uma cepa mais virulenta da 'H. pylori' devem ser alvo de intervenções para erradicar a bactéria", explicaram à Reuters Health, em entrevista por e-mail, Figueiredo e o co-autor do estudo, José Carlos Machado
Os pesquisadores lembraram ainda que, embora a cepa da bactéria e as variações genéticas aumentem o risco de câncer, os pacientes que têm os dois fatores simultaneamente não devem achar que estão fadados a desenvolver câncer de estômago.
"Em nível individual, o risco de câncer gástrico é muito, muito baixo. Não importa a constituição genética nem a cepa da bactéria", comentaram os autores da pesquisa.
A equipe portuguesa chegou a esses resultados a partir da análise de 221 pacientes com inflamação crônica do estômago (gastrite) e de 222 pessoas com câncer gástrico. Os pesquisadores identificaram as cepas da "H. pylori" presentes e quais as características genéticas mais comuns em pacientes com câncer de estômago.
Blaser explicou que tanto a cepa da "H. pylori" quanto as variações genéticas mais associadas ao câncer de estômago foram as responsáveis por aumentar o processo inflamatório no organismo - a inflamação prolongada pode elevar o risco de câncer gástrico.
Na opinião de Blaser, erradicar a "H. pylori" nem sempre é a melhor opção. Estudos têm mostrado que a bactéria pode prejudicar o estômago, mas pode ser útil ao esôfago. No entanto, se outras pesquisas confirmarem os resultados do trabalho atual, Blaser sugere que essas conclusões sejam aplicadas para identificar os grupos de pacientes com risco maior de desenvolver câncer de estômago; em outras palavras, "determinar quais pessoas deveriam receber tratamento para eliminar a bactéria e aquelas que se beneficiariam da preservação desses microrganismos".