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  Especial Síndrome de Down
"O grande desafio é não achar que a síndrome é algo exótico"

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BBC Brasil: Entre a sua reportagem sobre um menino com Down, em 1991, até hoje, a senhora acha que a situação para as pessoas que nasceram com esta síndrome melhorou?

Claudia Werneck: Avançamos muito mas ainda é muito pouco. Trata-se de uma longa trajetória de exclusão, de não-reconhecimento, de não-entendimento de que pessoas que nascem com uma síndrome genética são detentoras de direitos como o de estar na escola, no trabalho, em todos os espaços sociais.

BBC Brasil: Qual seria o maior desafio atualmente para uma pessoa com síndrome de Down?

Werneck: Acho que é o da expressão, o direito de se comunicar na língua que é sua, com a dificuldade que é muitas vezes inerente à síndrome de Down.

Mesmo com estimulação precoce e fonoaudiologia, é muito comum que a pessoa tenha dificuldades na fala. O grande desafio está no direito de ser ouvido, de se comunicar, de ter o seu tempo de comunicação.

Para os pais, o maior desafio é conseguir colocar o seu filho com a maior dignidade numa escola regular de qualidade, para que eles sejam reconhecidos como parte da geração a quem pertencem, que eles possam desde cedo se exercitar eticamente junto com pessoas da mesma idade e, juntos, participar deste grande exercício que é se tornar cidadão.

Para a sociedade, o grande desafio é olhar para uma pessoa com síndrome de Down e não achar que ela é o exótico da natureza. Isto é um grande equívoco. Esta é uma idéia profundamente segregacionista, quase nazista.

Este é, portanto, o grande desafio da sociedade, vencer seu próprio ranço na visão deturpada que ela tem de pessoas que representam a diferença.

BBC Brasil: O que a idéia de uma sociedade inclusiva?

Werneck: A inclusão é uma proposta de uma transformação política da sociedade, uma alteração estrutural, onde o mundo precisa ser preparado não para as pessoas que têm deficiência, mas para todos. Se você, por exemplo, tem a preocupação de modificar o ambiente para que uma pessoa com deficiência física possa se locomover melhor, você está melhorando este ambiente para idosos, obesos, grávidas em fim de gestação...

Estão enganados, portanto, os que acreditam que o conceito de inclusão está relacionado somente às pessoas que têm uma deficiência. Não é. Ele tem a ver com o ser humano.

Para que todas as pessoas tenham o direito de contribuir com os seus talentos para o bem comum, mesmo que este talento seja um piscar de olhos.

O que fazemos é comparar valores de pessoas, é achar que algumas pessoas valem mais do que outras e que o deficiente tem um saber menor.

É uma prática nossa, do dia-a-dia, a hierarquização do ser humano, atitude tomada por tantos ditadores no decorrer da história. Mas fazemos isso de uma forma muito disfarçada, muito subliminar.

BBC Brasil: A senhora poderia dar um exemplo tirado do cotidiano?

Werneck: Me lembro que na abertura das Olímpiadas de Sidney, um jornalista disse: "Aqui está o melhor da raça humana". Bom, se você fala no melhor da raça humana, é porque você assume que existe o pior da raça humana. E, no mínimo, o oposto ao atleta, é o deficiente.

BBC Brasil: O tema da deficiência não seria dos mais populares então?

Werneck: Nós, adultos esclarecidos, temos uma preocupação muito grande em ter uma visão crítica em relação à economia, política, cultura, ao que acontece no mundo. Se não temos, fica a impressão de que somos mal informados. Entretanto, quando o tema é deficiência, que entra num campo maior que é o da diversidade humana, as pessoas se equivocam bastante e ninguém tem problema de estar por fora, ninguém acha que este assunto tem status para a formação de um profissional, de um cidadão.

Tem um exemplo que eu dou em um dos meus livros, que é assim: Uma criança de seis anos pergunta para o pai, na hora do jantar, na mesa: "pai, o que é mouse, o que é dólar, o que é internet, quem é Sadam?" O pai fica orgulhosíssimo do filho e depois do jantar liga para a mãe e conta a gracinha do filho.

No dia seguinte, o pai comenta no trabalho sobre o acontecimento da véspera e o colega manda outra história ainda mais mirabolante sobre o próprio filho.

Agora, vamos supor que esta mesma criança pergunte para o pai o que é síndrome de Down, ou o que é deficiência física, o que é paralisia cerebral... Você acha que este pai vai achar que o filho dele é muito esperto? Ele vai achar estranhíssima esta pergunta, vai querer saber como ele soube disso e a mãe, querendo tirar o mal-estar criado por esta pergunta, vai dizer: "Ah, filho, não pensa em síndrome de Down, não, pois é muito triste. Come a sua comidinha pois ela vai esfriar".

Neste momento, o adulto além de desvalorizar a curiosidade da criança em relação a um tema que é o mais seu de todos, o da humanidade, ele detona o estopim do grande processo que inicia o preconceito. Isto porque o adulto não tem informação para dar, não quer dar a informação, e mais, acha que esta curiosidade não vai contribuir em nada para a formação deste filho.

É o que chamamos de falta de formação, que é um acúmulo lento e silencioso sobre visões deturpadas das diversidade humanas e, por consequência, sobre qualquer tema relacionado à deficiência e que nós carregamos pela vida.

BBC Brasil: A deficiência se torna assim um tema tabu?

Werneck: Exato. É aquele papo de que é um assunto "delicado". Não é delicado, você o transformou num tema delicado. A síndrome de Down é a anomalia genética mais comum do planeta. No Brasil, os índices variam muito mas é em torno de um nascimento a cada 600/700. Ou seja, é uma população imensa. Em termos de bebês concebidos e que não chegam a nascer, é um índice mais de 20 vezes maior. Se nós formos levar em conta alguns dados da Academia Francesa de Medicina que diz que mais da metade dos bebês concebidos que não chegam a nascer têm anomalias genéticas grosseiras incompatíveis com a vida, chegamos à conclusão que a pessoa que tem uma anomalia genética congênita é, na verdade, maioria. Nós, no entanto, pessoas sem deficiência, ou anomalia genética, continuamos a achar que somos a maioria e tratamos as pessoas com deficiência ou anomalia genética como se elas fossem o detalhe da humanidade.

BBC Brasil: Dentro da proposta da inclusão, portanto, uma escola especializada para as pessoas com síndrome de Down, por exemplo, não seria ideal.

Werneck: A escola inclusiva nada mais é do que uma escola de qualidade para todos. Por exemplo, se alguém me diz que a escola tal tem um aluno com Down, um aluno que não ouve, outro que não enxerga... Esta escola é inclusiva? Eu responderia: Não sei, pois não sei se a escola é de qualidade.

Se eu tivesse estudado a minha vida toda com 30 pessoas muito parecidas comigo, eu estaria menos preparada para vida do que estou hoje. Quanto mais a diversidade se manifesta ao meu lado, melhor será a minha formação. Este é o ponto principal para eu não achar que a escola especial forme cidadãos como eles devem ser formados.

Mas quero deixar claro que não acho que a escola regular esteja formando cidadãos como eles devem ser formados. Só que você parte do princípio que a escola regular pode se abrir para a diversidade, e a escola especializada, não. Porque ela nega a diversidade e muito claramente.

BBC Brasil: Em suas viagens ao exterior para participar de congressos, a senhora percebeu se o Brasil se destaca positivamente em alguma área em relação ao que se faz lá fora?

Werneck: Eu me surpreendi favoravelmente num encontro há dois anos, durante a palestra de duas dentistas brasileiras. Percebi que, na Europa, não existe o hábito de colocar aparelhos dentários em jovens com Down, o que, no Brasil, é totalmente comum para os que têm como acessar um bom dentista.

Neste dia, estas dentistas brasileiras explicaram que as crianças que colocavam aparelho respiravam e dormiam melhor. A comunidade internacional reagia como se estivesse ouvindo algo revolucionário.

Além disso, o Brasil tem uma forma bastante aberta de receber as pessoas com síndrome de Down. Conheço mais casais que fazem o diagnóstico precoce e recebem o bebê com alegria.

O grande problema do país é a falta de assistência, a dificuldade em fazer a estimulação precoce, em se ter acesso a terapeutas, ou mesmo a própria questão da saúde. Neste ponto estamos muito atrás.

Em termos de educação, vejo países que são totalmente contra a inclusão. No Brasil, a política do MEC é em defesa da inclusão; não que a prática tenha mostrado isso.

Lais Mendes Pimentel / BBC Brasil

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