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François Truffaut,
o homem que amava o cinema (1932-1984)
De todos os cineastas da Nouvelle Vague, foi aquele que cultivou a mais
intensa relação com o cinema, passando por quase todos os estágios da
experiência cinematográfica.
Nascido em 6 de fevereiro de 1932, François Truffautt teve uma infância
muito difícil. Vivenciou paralelamente a ocupação francesa pelos alemães
e a desagregação do lar, muito bem resumida no autobiográfico Os
Incompreendidos, estrelado por Jean-Pierre Léaud, que viria a
ser seu alter ego nas telas. Aos oito anos foi enviado pelos pais para
a avó. Desde então, passou a se refugiar no colossal Gaumont-Palace, com
capacidade para 4.500 espectadores, sua segunda casa.
Aos quinze anos, fundou um cineclube, condenado à falência por concorrer
com outro cineclube gerenciado por ninguém menos que o grande crítico
André Bazin. O risco acabou dando certo. Sensibilizado com a história,
Bazin pagou a fiança e assumiu o papel de tutor do adolescente. Foi ele
quem incentivou Truffaut a escrever suas primeiras críticas para a recém-fundada
revista Cahiers du Cinéma, abrindo assim uma nova perspectiva para
o rapaz.
Ali Truffaut conheceu
uma geração que faria história trocando o teclado das máquinas de escrever
pelos equipamentos de filmagem. Ao lado de Godard, Chabrol, Rohmer, Resnais
e Rivette, entre outros, Truffaut desenvolveu nas páginas a teoria do
cinema de autor e nas telas a poética da Nouvelle Vague.
Foi assistente de Roberto Rosselini, co-produtor de O Testamento de
Orfeu, de Jean Cocteau, escritor do roteiro de Acossado, de
Godard, e Mata Hari, de J. Richard. Dedicou um livro antológico
de entrevistas a seu mestre soberano: Alfred Hitchcock. Nos filmes, deixou
registradas suas paixões pela literatura, pelo cinema e pelas mulheres.
Um filme era um gesto de amor movido pela paixão feminina. Jeanne Moreau,
Bernadette Laffont, Catherine Deneuve, Jacqueline Bisset, Isabelle Adjani
e Fanny Ardant, esta sua última esposa, foram alvos de uma câmera enternecida
e apaixonada. Truffaut foi ainda ator de alguns de seus próprios filmes,
A Noite Americana (Oscar de Melhor Filme Estrangeiro), O
Garoto Selvagem e La Chambre Verte. Além, é claro, da inesquecível
ponta em Contatos Imediatos do Terceiro Grau, de Steven Spielberg.
Morreu prematuramente, aos 52 anos, vítima de câncer no cérebro. Sem dúvida
uma injustiça divina contra o autor que fez do cinema o espaço de transfiguração
de uma das mais sublimes experiências humanas: o amor ao próximo. Faz
falta.
FILMOGRAFIA
- "De
Repente num Domingo" (Vivement dimanche!), 1983
- "A Mulher do Lado" (La Femme d'à côté), 1981
- "O Último Metrô" (Le Dernier métro), 1980
- "O Amor em Fuga" (L'Amour en fuite), 1979
- "O Quarto Verde" (La Chambre verte), 1978
- "O Homem que Amava as Mulheres" (L'Homme qui aimait les femmes),
1977
- "Na Idade da Inocência" (L'Argent de poche), 1976
- "A História de Adele H." (L'Histoire d'Adèle H.), 1975
- "A Noite Americana" (La Nuit Américaine), 1973
- "Uma Jovem tão Bela como Eu" (Une belle fille comme moi),
1972
- "Duas Inglesas e o Amor" (Les Deux anglaises et le continent),
1971
- "Domicílio Conjugal" (Domicile conjugal), 1970
- "O Garoto Selvagem" (L'Enfant sauvage), 1969
- "A Sereia do Mississipi" (La Sirène du Mississippi), 1969
- "Beijos Roubados" (Baisers volés), 1968
- "A Noiva Estava de Preto" (La Mariée était en noir), 1967
- "Fahrenheit 451" (Fahrenheit 451), 1966
- "Um Só Pecado" (La Peau douce), 1964
- "O Amor aos Vinte Anos" (L'Amour à vingt ans - episódio "Antoine
et Colette"), 1962
- "Uma Mulher para Dois" (Jules et Jim), 1961
- "Atire no Pianista" (Tirez sur le pianiste), 1960
- "Os Incompreendidos" (Les Quatre cents coups), 1959
- "Une histoire d'eau" (curta-metragem), 1958
- "Les Mistons" (curta-metragem), 1957
- "Une visite" (curta-metragem), 1955
Ricardo Cota, 33, é crítico de cinema
do Jornal do Brasil há oito anos, com passagens pelas revistas Cinemin,
Set, Tabu, Cinema e IstoÉ, além do jornal O Dia. Foi autor dos cursos
Bergman/Woody Allen: Dois Cineastas Face a Face; Huston/Coppola: Os jogadores;
e O Cinema Cantado, Breve História dos Musicais.
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