Porto Alegre - João Derly Nunes Júnior conquistou o título de campeão mundial júnior (sub-20). Foi em Nadeul, na Tunísia, que ele subiu ao pódio para receber a medalha de ouro na categoria ligeiro (até 60 quilos). E João, 19 anos, conseguiu o feito inédito mesmo sem ouvir a voz do técnico da Sogipa Antônio Carlos Pereira, o Kiko, cujas orientações o acompanham desde os seis anos.
Uma dica do treinador pode decidir uma luta e valer o ouro. Foi exatamente dessa dica que Moacir Mendes Júnior, 19, sentiu falta. Talvez, se alguém tivesse chamado sua atenção, poderia ter ido ainda mais longe do que o bronze na meio-leve (até 66 quilos).
A alegação da Confederação Brasileira de Judô (CBJ) para não levar o técnico foi a contenção de custos. Porém, cinco presidentes de federações estaduais, segundo Moacir, conheceram o país localizado no norte da África, na costa do Mediterrâneo.
Kiko não demonstra mágoa por isso. Na verdade, mal consegue conter a alegria e a ansiedade porque a trajetória de João está sendo a mesma de alguns dos melhores judocas do país. João é o quarto brasileiro a ser campeão mundial júnior. Antes dele, apenas Aurélio Miguel, em 1981, Sebastian Pereira, em 1996, e Tiago Camilo, em 1998, venceram nessa competição. Aurélio e Tiago são medalhistas olímpicos. "O João também tem tudo para chegar lá", assegura Kiko, com entusiasmo. "Ele pensa em judô o dia inteiro."
João tem duas grandes qualidades para torná-lo um medalhista ou um campeão olímpico. A primeira é que consegue unir a força e a explosão da escola européia com a tradicional técnica da japonesa. "É como se ele tivesse a habilidade do Ronaldinho e a força do Dunga", exemplifica Kiko.
A segunda qualidade se cristaliza em um autocontrole de enervar (os outros, principalmente o adversário). João é frio e concentrado. Em Nadeul, das cinco vezes em que pisou no tatame, apenas em uma admite ter sentido nervosismo. Foi na semifinal, contra o argentino Miguel Albarracin:
"Fiquei um pouco abalado porque recém o Moacir tinha sido derrotado e perdido a chance de continuar brigando pelo ouro. Aquela luta foi a única que não venci por ippon (o golpe perfeito no judô)". Mas, depois de ter derrubado o austríaco Ludwig Paischer na disputa decisiva, João chorou abraçado a Moacir.
A dedicação máxima nos últimos dois anos rendeu a João uma orelha repolhada. É isso mesmo, a aparência da esquerda, machucada quatro vezes, de tanto roçar na aspereza do tatame, lembra um repolho. A direita parece menos esfolada, porém é a que dói mais. Sofreu a segunda lesão na Tunísia e está inflamada. "Às vezes, até a vibração do vento desperta a dor", diz João com a naturalidade com que falaria sobre alguma disciplina da faculdade de Educação Física na Ulbra.
Na verdade, é indiferente mesmo. João quer continuar juntando títulos – também é 14 vezes campeão brasileiro, bi sul-americano adulto, campeão pan-americano júnior e bronze no Mundial juvenil. Na seletiva para a Olimpíada de Sydney, não acordou em um bom dia e ficou fora. Agora, pensa nos Jogos de 2004, em Atenas:
"A Grécia deve ser muito bonita, não é mesmo?"
Tradição vem formando bons judocas há anos
"Bah! Estamos vivendo uma época e tanto", comemora o técnico da Sogipa Antônio Carlos Pereira, o Kiko. Todo esse entusiasmo não se limita ao ouro de João Derly Nunes Júnior e ao bronze de Moacir Mendes Júnior no Mundial da Tunísia. É por outra atleta sua, Mariana Martins, ter sido a primeira gaúcha a participar de Olimpíada, a de Sydney, em setembro. É por Taciana Lima Rezende – que derrotou Mariana na seletiva – também ter ido ao Mundial da Tunísia.
A tradição do Rio Grande do Sul como formador de judocas vencedores é regular desde o início da década de 90, quando Diogo Chamun embarcou para a espanhola Barcelona como o primeiro gaúcho a lutar em um mundial adulto. E continou com outros, como Alexandre Garcia, que participou da Olimpíada de Atlanta/1996. A trajetória de Garcia é emblemática porque é a mesma que se verificou com outros judocas e tem a possibilidade de continuar acontecendo. O atleta se mudou para São Paulo em busca de melhores oportunidades em 1997. Hoje, defende o São Caetano e atua como coordenador do Projeto Futuro, no qual treina Tiago Camilo, prata nos Jogos de Sydney.
Kiko demonstra apreensão quando admite que João, Moacir, Mariana ou Taciana também podem ser seduzidos por propostas do Rio ou de São Paulo, os dois Estados que também são referências no esporte. "Na Sogipa, não falta infra-estrutura e apoio. Mas eles precisam ainda de mais ajuda", afirma o treinador.
O técnico da Ulbra, Luiz Maduro, acredita que um entrave ao desenvolvimento dos judocas nacionais é a própria Confederação Brasileira de Judô, que não oferece a estrutura necessária e não recebe verbas públicas desde 1991 porque as contas foram rejeitadas pelo Tribunal de Contas da União:
"Quantos Joãos e Tiagos não estão sendo afastados das competições, ou tendo suas carreiras abreviadas, porque a Confederação não muda seus procedimentos, como a cobrança de valores absurdos para um atleta viajar ao Exterior?"
Porto Alegre - João Derly Nunes Júnior conquistou o título mais importante para o judô gaúcho – o de campeão mundial júnior (sub-20). Foi no dia 29 de outubro, em Nadeul, na Tunísia, que ele subiu ao pódio para receber a medalha de ouro na categoria ligeiro (até 60 quilos). E João, 19 anos, conseguiu o feito inédito mesmo sem ouvir a voz do técnico da Sogipa Antônio Carlos Pereira, o Kiko, cujas orientações o acompanham desde os seis anos.
Uma dica do treinador pode decidir uma luta e valer o ouro. Foi exatamente dessa dica que Moacir Mendes Júnior, 19, sentiu falta. Talvez, se alguém tivesse chamado sua atenção, poderia ter ido ainda mais longe do que o bronze na meio-leve (até 66 quilos).
A alegação da Confederação Brasileira de Judô (CBJ) para não levar o técnico foi a contenção de custos. Porém, cinco presidentes de federações estaduais, segundo Moacir, conheceram o país localizado no norte da África, na costa do Mediterrâneo.
Kiko não demonstra mágoa por isso. Na verdade, mal consegue conter a alegria e a ansiedade porque a trajetória de João está sendo a mesma de alguns dos melhores judocas do país. João é o quarto brasileiro a ser campeão mundial júnior. Antes dele, apenas Aurélio Miguel, em 1981, Sebastian Pereira, em 1996, e Tiago Camilo, em 1998, venceram nessa competição. Aurélio e Tiago são medalhistas olímpicos. "O João também tem tudo para chegar lá", assegura Kiko, com entusiasmo. "Ele pensa em judô o dia inteiro."
João tem duas grandes qualidades para torná-lo um medalhista ou um campeão olímpico. A primeira é que consegue unir a força e a explosão da escola européia com a tradicional técnica da japonesa. "É como se ele tivesse a habilidade do Ronaldinho e a força do Dunga", exemplifica Kiko.
A segunda qualidade se cristaliza em um autocontrole de enervar (os outros, principalmente o adversário). João é frio e concentrado. Em Nadeul, das cinco vezes em que pisou no tatame, apenas em uma admite ter sentido nervosismo. Foi na semifinal, contra o argentino Miguel Albarracin:
"Fiquei um pouco abalado porque recém o Moacir tinha sido derrotado e perdido a chance de continuar brigando pelo ouro. Aquela luta foi a única que não venci por ippon (o golpe perfeito no judô)". Mas, depois de ter derrubado o austríaco Ludwig Paischer na disputa decisiva, João chorou abraçado a Moacir.
A dedicação máxima nos últimos dois anos rendeu a João uma orelha repolhada. É isso mesmo, a aparência da esquerda, machucada quatro vezes, de tanto roçar na aspereza do tatame, lembra um repolho. A direita parece menos esfolada, porém é a que dói mais. Sofreu a segunda lesão na Tunísia e está inflamada. "Às vezes, até a vibração do vento desperta a dor", diz João com a naturalidade com que falaria sobre alguma disciplina da faculdade de Educação Física na Ulbra.
Na verdade, é indiferente mesmo. João quer continuar juntando títulos – também é 14 vezes campeão brasileiro, bi sul-americano adulto, campeão pan-americano júnior e bronze no Mundial juvenil. Na seletiva para a Olimpíada de Sydney, não acordou em um bom dia e ficou fora. Agora, pensa nos Jogos de 2004, em Atenas:
"A Grécia deve ser muito bonita, não é mesmo?"
Tradição vem formando bons judocas há anos
"Bah! Estamos vivendo uma época e tanto", comemora o técnico da Sogipa Antônio Carlos Pereira, o Kiko. Todo esse entusiasmo não se limita ao ouro de João Derly Nunes Júnior e ao bronze de Moacir Mendes Júnior no Mundial da Tunísia. É por outra atleta sua, Mariana Martins, ter sido a primeira gaúcha a participar de Olimpíada, a de Sydney, em setembro. É por Taciana Lima Rezende – que derrotou Mariana na seletiva – também ter ido ao Mundial da Tunísia.
A tradição do Rio Grande do Sul como formador de judocas vencedores é regular desde o início da década de 90, quando Diogo Chamun embarcou para a espanhola Barcelona como o primeiro gaúcho a lutar em um mundial adulto. E continou com outros, como Alexandre Garcia, que participou da Olimpíada de Atlanta/1996. A trajetória de Garcia é emblemática porque é a mesma que se verificou com outros judocas e tem a possibilidade de continuar acontecendo. O atleta se mudou para São Paulo em busca de melhores oportunidades em 1997. Hoje, defende o São Caetano e atua como coordenador do Projeto Futuro, no qual treina Tiago Camilo, prata nos Jogos de Sydney.
Kiko demonstra apreensão quando admite que João, Moacir, Mariana ou Taciana também podem ser seduzidos por propostas do Rio ou de São Paulo, os dois Estados que também são referências no esporte. "Na Sogipa, não falta infra-estrutura e apoio. Mas eles precisam ainda de mais ajuda", afirma o treinador.
O técnico da Ulbra, Luiz Maduro, acredita que um entrave ao desenvolvimento dos judocas nacionais é a própria Confederação Brasileira de Judô, que não oferece a estrutura necessária e não recebe verbas públicas desde 1991 porque as contas foram rejeitadas pelo Tribunal de Contas da União:
"Quantos Joãos e Tiagos não estão sendo afastados das competições, ou tendo suas carreiras abreviadas, porque a Confederação não muda seus procedimentos, como a cobrança de valores absurdos para um atleta viajar ao Exterior?"