São Paulo - Polêmico, falastrão e líder. Estas são algumas características de Rogério Ceni, goleiro titular da seleção, que, na quarta-feira, defenderá o Brasil contra a Colômbia. Por acaso. Se não fosse a realização de uma "pelada" em Sinop (MT), sua cidade natal, há pouco mais de dez anos, dificilmente Rogério estaria vestindo a camisa 1 do São Paulo e da equipe nacional.
Quando era adolescente, ele costumava bater uma bola com os amigos em Sinop.
Jogava no meio-de-campo e vestia a camisa 5 ou a 8. "Gostava de jogar pelo lado direito", lembra Rogério, hoje com 27 anos. Numa das tardes, estava com os amigos e a partida iria começar, mas faltava um jogador para completar o time. Justamente para o gol. Os candidatos para assumir a posição eram poucos e a missão acabou sobrando para Rogério. "O pessoal me pediu e eu fui para o gol."
Rogério, que não tinha experiência nenhuma na posição, "fechou o gol" e saiu de campo idolatrado pelos colegas. A partir daquele dia, o são-paulino não deixou mais o "ingrato cargo de goleiro" até tornar-se profissional. Na época, tinha 16 anos.
Amanhã, o atleta começará a trabalhar com o técnico Leão, com o qual é muito parecido na forma de agir. Ele mesmo admite isso e sabe que as comparações são inevitáveis.
"Qualquer pessoa que emite opiniões, como o Leão e como eu, é considerada polêmica", diz.
Nenhum dos dois tem "papas na língua" e deixa de falar o que pensa. Na terça-feira, quando recebeu, no Centro de Treinamento do São Paulo, um batalhão de repórteres que queriam ouvir suas explicações pelos gols sofridos contra o Juventude, pela Copa João Havelange - falhou em dois -, Rogério atendeu a todos educadamente, mas não deixou de dar sua habitual "cutucada". "A imprensa tem mais é que aproveitar a situação de eu ter falhado para descer o cacete. Afinal, é notícia ruim que vende jornal", disse. "A culpa é sempre do goleiro; um atacante perde gols e nunca é lembrado." Leão, nos tempos de goleiro, tinha atitudes parecidas.
Polêmica - Justamente por apresentar uma personalidade forte, Rogério acredita ter se prejudicado em alguns momentos de sua vida.
No ano passado, por exemplo, disputou um amistoso pela seleção contra o Barcelona, na Espanha. O jogo terminou empatado por 2 a 2, ele falhou nos dois gols do time espanhol mas, no retorno ao País, disse que teve ótima atuação. Sua atitude foi desaprovada pelo então técnico Wanderley Luxemburgo, que o deixou fora da seleção por mais de um ano. "Com o tempo, aprendi a falar menos e a guardar algumas opiniões."
Às vezes, no entanto, esquece-se de que mudou. Nos últimos dias, preferiu não "guardar" uma opinião polêmica e partiu para o ataque. A vítima: o jornalismo esportivo, que diz não levar a sério. "Gosto muito de ler jornal, mas pulo o caderno de esportes."
Rogério fica irritado quando lê as notas às atuações dos jogadores dadas pelos jornalistas após os jogos. "Primeiro, porque não existe critério; um jornal dá nota 7 para um jogador e outro dá 4. Depois, porque muitos não têm base para fazer uma análise. Já vi muitos desses repórteres jogarem bola no CT do São Paulo. Só dão de canela e não sabem dominar uma bola. Como é que podem dar uma nota?", perguntou. "Acho tudo isso uma babaquice e até me divirto quando vejo esse tipo de coisa no jornal."
Em relação à CPI do Futebol, também não poupa palavras para fazer críticas.
"Tudo é válido, mas não tenho nenhuma dúvida de que existem várias outras CPIs muito mais importantes."
Drama - Entre alegrias e decepções, Rogério passou pelo momento mais doloroso em 93, quando estreava como profissional no São Paulo.
Na ocasião, participava de uma excursão pela Espanha, quando soube da morte da mãe, Hertha. Retornou ao Brasil para o enterro e, no dia seguinte, estava de volta à Europa. "O episódio me fez amadurecer, ter mais responsabilidade e dar valor às pessoas." Teve o apoio dos familiares e dos amigos para superar o trauma. Atualmente, antes das partidas, quando os jogadores se reúnem para fazer a oração, o goleiro lembra-se da mãe e pede proteção a ela.
Quem sempre está presente nos momentos mais importantes de sua vida é a psicóloga Sandra, sua namorada há nove anos. Rogério ainda não fez planos para se casar, mas reconhece que a hora está chegando.
Ao contrário de muitas namoradas de jogadores e de personalidades em geral, Sandra não passa de uma anônima. Afinal, Rogério não abre mão da privacidade e procura preservar a família. A casa, por exemplo, não abre para quase ninguém. "É o único lugar onde tenho privacidade e, por isso, só meus amigos entram nela." Tem pavor, também, de exibir seu automóvel. "O carro é para o conforto meu e de minha família e não interessa a ninguém qual é o modelo."
Além de falar com carinho da namorada e dos familiares, Rogério faz questão de se lembrar de três pessoas, que, segundo ele, foram muito importantes em sua vida: o goleiro Zetti, com quem trabalhou no São Paulo de 93 a 96, o preparador de goleiros Valdir de Morais e o técnico Telê Santana.
Curiosamente, pode voltar a trabalhar com Zetti, numa situação oposta. Ele como titular e o veterano goleiro na reserva. O São Paulo tem intenção de contratar Zetti para a próxima temporada, como um reserva de luxo.
Guitarra - Um de seus passatempos prediletos, principalmente em dias de concentração, é tocar guitarra. No segundo semestre de 1998, começou a ter aulas de violão, acompanhado por Fábio Aurélio, hoje no Valencia, da Espanha. O lateral-esquerdo desistiu no início, mas Rogério continuou até aprender a "enganar", como gosta de dizer.
Preferiu, depois, deixar o violão para dedicar-se apenas à guitarra. Não esconde a paixão pela música. É fã, dentre outros, do grupo Pink Floyd e de Shania Twain (cantora popular norte-americana). Entre um treino e outro, a guitarra é a melhor companheira.
Em vez de ir a boates, badalar nas agitadas noites da capital paulista ou sair para beber, o goleiro são-paulino freqüenta cinema, teatro ou restaurantes, sempre acompanhado da namorada. A responsabilidade fora de campo é uma das razões que fazem de Rogério um goleiro de ponta e, segundo ele, o ajuda a estar sempre bem fisicamente. Nunca dá trabalho aos treinadores. Não falta aos treinamentos e jamais chega atrasado. "É um exemplo", resume o técnico tricolor, Levir Culpi.
Dilema - Para o futuro, ainda não fez planos. Acredita que pode jogar pelo menos por mais cinco ou seis anos, mas, depois, não pretende continuar no futebol. "Fazer faculdade seria uma boa opção, mas não sei se teria paciência de fazer um curso completo."
Certo mesmo é o sonho de disputar a primeira Copa do Mundo em 2002, no Japão e na Coréia do Sul. O primeiro passo, o de assumir a posição de titular do gol do Brasil, já foi dado. "Mas falta ainda um ano e meio e não posso me considerar garantido na Copa."
Fazer um gol com a camisa canarinho não é uma preocupação, segundo ele garante, mesmo tendo a liberação de Leão para cobrar faltas e sabendo que pode entrar para a história - nenhum goleiro fez gol pela seleção brasileira em partidas oficiais. Não esconde, no entanto, que o momento mais alegre de sua carreira foi justamente quando marcou um gol, o primeiro da decisão do Campeonato Paulista deste ano, contra o Santos, no Morumbi.