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Terrores noturnos povoam A Bruxa de Blair
O mais badalado filme de terror dos últimos tempos chega finalmente ao Brasil.
Escrito, dirigido e montado como se fosse um documentário por Daniel Myrick e Eduardo Sanchez, A Bruxa de Blair (The Blair Witch Project) conta a história de três estudantes que se embrenham numa floresta para rodar um filme sobre a lenda de uma bruxa e nunca mais são vistos.
Um ano depois, seus filmes e gravações são encontrados e se transformam no filme A Bruxa de Blair, que acompanha a angustiante jornada de cinco dias através da floresta e os eventos aterrorizantes que resultaram no sumiço dos universitários Heather Donahue, Joshua Leonard e Michael Williams.
A Bruxa de Blair custou cerca de US$ 35 mil e, até segunda-feira passada (20 de setembro de 99), em 75 dias de exibição nos Estados Unidos, já havia faturado US$ 138 milhões. É o maior fenômeno de público da história do cinema independente norte-americano. O filme ganhou a capa das duas revistas mais importantes daquele país, a Time e a Newsweek.
A teimosia de Heather vai custar caro...
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O êxito é atribuído a uma atmosfera sufocante – o espectador só vê o que as câmeras dos jovens registram – e a uma engenhosa campanha de marketing. A pequena distribuidora Artisan fez do site oficial de A Bruxa de Blair uma verdadeira bíblia, acessada por mais de 20 milhões de pessoas antes da estréia. As informações divulgadas na Internet deram força à crença de que a história era baseada em fatos reais. O visual do filme lembra o de um vídeo caseiro, e Myrick, 35 anos, e Sanchez, 30, escalaram atores amadores, que usam os nomes verdadeiros no filme. À noite, os diretores rondavam a tenda do elenco para assustá-lo com gritos e ruídos.
A Bruxa de Blair é mais um dos recentes filmes norte-americanos que exploram uma temática sobrenatural. Já está em cartaz no Brasil A Casa Amaldiçoada, com Liam Neeson e Catherine Zeta-Jones. Vem aí O Sexto Sentido, com Bruce Willis no papel de um psicólogo que ajuda um garoto que vê fantasmas, O 13º Guerreiro, baseado num livro de Michael Crichton que mistura muçulmanos, vikings e ursos-demônios, e Stigmata, em que Patricia Arquette é atacada pelo Diabo. Esse último filme, aliás, ganhou fama de maldito depois que um figurante de 86 anos morreu de um ataque cardíaco durante uma cena rodada no Vaticano.
(Ticiano Osório - Agência RBS)
Cronologia
da bruxa
Um dos trunfos de A Bruxa de Blair é a mitologia criada por Daniel Myrick e Eduardo Sanchez e divulgada no site oficial do filme. Eles elaboraram uma cronologia que vai do surgimento da lenda da feiticeira até a descoberta do material filmado e gravado pelos três estudantes desparecidos na floresta.
Fevereiro de 1785 – várias crianças acusam Elly Kedward de atraí-las para sua casa para retirar o sangue delas. Kedward é condenada por feitiçaria, banida da vila de Blair durante um rigoroso inverno e dada como morta.
Novembro de 1786 – todos aqueles que acusaram Kedward e metade das crianças de Blair desaparecem. Temendo uma praga, a população foge e jura nunca mais pronunciar o nome da bruxa.
Novembro de 1809 – é publicado O Culto da Bruxa de Blair, um livro raro.
1824 – onde antes ficava Blair, é fundada a cidade de Burkittsville.
Agosto de 1825 – 11 pessoas afirmam ter visto a mão de uma mulher pálida empurrar Eileen Treacle, 10 anos, para a Enseada de Tappy. O corpo nunca foi encontrado e, durante 13 dias, a enseada fica obstruída com feixes de galhos.
Março de 1886 – Robin Weaver, oito anos, é dado como desaparecido, e, depois de seu retorno, um dos grupos de busca some. Os corpos são encontrados semanas depois no Rochedo Coffin (em inglês, caixão), amarrados e sem as entranhas.
Novembro de 1940/Maio de 1941 – sete crianças são raptadas na região de Burkittsville.
25 de maio de 1941 – Rustin Parr, um velho eremita, conta aos freqüentadores de um mercado que ele completou sua missão. A polícia encontra em sua casa isolada na floresta os corpos das sete crianças desaparecidas. Parr afirma que cometeu o crime para “um fantasma de uma velha”. É condenado e enforcado.
20 de outubro de 1994 – alunos da Faculdade de Montgomery, Heather Donahue, Joshua Leonard e Michael Williams chegam a Burkittsville para realizar um documentário sobre a lenda da Bruxa de Blair. Mary Brown, uma velha praticamente insana, conta ao trio que viu, perto da enseada, uma criatura meio humana, meio animal.
21 de outubro de 1994 – os três jovens se embrenham na floresta Black Hills para chegar ao Rochedo Coffin e nunca mais são vistos.
26 de outubro de 1994 – depois de achar o carro de Josh, a polícia estadual de Maryland faz uma busca na área de Black Hills, com cem homens, cães, helicópteros e o auxílio de um satélite do Departamento de Defesa dos Estados Unidos.
3 de novembro de 1994 – a busca é interrompida. A mãe de Heather começa uma exaustiva busca pessoal. O caso é declarado sem solução.
16 de outubro de 1995 – alunos do departamento de Antropologia da Universidade de Maryland descobrem uma bolsa, contendo 11 filmes em preto-e-branco, 10 fitas de vídeo, câmeras e o diário de Heather, enterrada sob a fundação de uma cabana centenária.
Medo ou decepção?
O "filme mais assustador do ano" pode ser uma decepção para quem espera uma tensão insuportável na boca do estômago ou uma obra-prima do pavor "psicológico". Elogiado por prescindir totalmente do terror explícito e violento para envolver o espectador, A Bruxa de Blair acaba gerando um anti-clímax através dessa mesma virtude. Ao atribuir ao público a tarefa de imaginar a tragédia inominável que arrebata os heróis da trama, com longas passagens escuras onde só se ouvem os lamentos desesperados dos protagonistas, os diretores Daniel Myrick e Eduardo Sanchez poderiam ter caprichado um pouco mais nesse exercício de sugestão.
Josh e Mike em desespero: deterioração psicológica é um dos pontos altos de A Bruxa de Blair
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O ótimo desempenho dos atores é um dos grandes trunfos do filme, já que se pode sentir o terror das vítimas acuadas e perdidas em uma floresta povoada por um ente maligno, mas as estripulias dessa entidade poderiam ser mais assustadoras, mesmo que apenas sugeridas. Apesar da deterioração psicológica do trio ser assustadora e convincente, fica difícil acreditar que algo sobrenatural ronda o destino dos personagens.
O que afinal acontece durante as noites de vigília de Heather, Mike e Josh, até o desfecho? Eles ouvem gritos e vozes, dificilmente identificáveis por quem assiste. A barraca onde dormem é rodeada por feixes de madeira e pilhas de pedras típicos de bruxaria. Ouvem coisas estranhas e ficam gritando "Oh, meu Deus, o que é isso?".
Quando um deles desaparece, Heather topa com um vodoo pra lá de desagradável. Ela chora pungentemente com a descoberta, difícil de ser identificada apesar da moça não tirar o foco da câmera do que encontrou. E na sequência final, quando entram na velha cabana abandonada supostamente para morrer, o mesmo recurso se repete: vozes, gritos, e a câmera alucinada da "documentarista", que nem com a tal bruxa nos calcanhares e a sombra da morte nas costas, tem a presença de espírito de desligar o equipamento. Assim, além da ilusão de "verdade documental" ficar um pouco comprometida, a bruxa também perde a sua credibilidade. Com uma literatura tão vasta sobre o assunto e um site oficial recheado de "referências mitológicas", a bruxa de Blair bem merecia um caldeirão fervente de sustos bem elaborados para convencer o público de sua existência.
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(Cássia Borsero)
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