Sydney - A cota prevista por Andy Wharol, de 15 minutos de fama, talvez fosse demais para o esgrimista paulistano Marco Antonio Trevizani Martins, 27 anos, que nesta quarta-feira estreou e se despediu da Olimpíada de Sydney ao perder para o inglês James Beevers por 15 a 7. O duelo pelo torneio individual de florete durou menos de três minutos, mas na avaliação de Marco valeu uma eternidade.
"Interromperam a novela das sete para transmitir tudo ao vivo", vibrava o atleta brasileiro, um dentista que precisou revezar seus cinco empregos com quatro horas diárias de treino até chegar na Austrália. Não é difícil entender a alegria de Marco Martins, mais conhecido como Keko, apesar da derrota logo no primeiro combate.
A esgrima no Brasil ainda não saiu da indigência. E nem é preciso qualquer comparação com o futebol. Basta olhar a natação, que tem um patrocínio milionário dos Correios e recebeu R$ 256 mil do COB para esta Olimpíada, ou o judô, dono de um orçamento de R$ 656 mil em Sydney. Já a esgrima, sem qualquer incentivo, ficou com R$ 16 mil, valor só maior do que o também miserável levantamento de peso.
Até mesmo o venezuelano Carlos Rodriguez conta com uma infra-estrutura maior do que seu colega brasileiro. "Já ganhei dele em um Pan-Americano, mas não dá para concorrer", diz Keko. "Enquanto eu faço uma competição internacional por ano, ele participa de 38 torneios pelo mundo", constata. Não por acaso, Rodriguez venceu o russo Ilgar Mamedov e chegou até as oitavas-de-final.
Um sonho impossível nas atuais condições do esgrimista brasileiro. Dentista em três consultórios e professor em duas faculdades, Keko tem de treinar às próprias custas. Mesmo assim, foi campeão sul-americano (1996-98) e vice-campeão pan-americano (97). Quando chega numa Olimpíada, porém, tem de enfrentar atletas de ponta, que recebem em dólar para participar de torneios e se aprimorar em um dos esportes mais técnicos que existe.
Mas isso está mudando, anuncia o próprio Marco. Depois de assinar um contrato recente com o Vasco da Gama, Keko acha que terá dinheiro e tempo suficientes para largar dois empregos. Poderá dispensar o consultório da irmã, em Salto, e as aulas de uma faculdade de Campinas.
No seu caso, economizar essas viagens e ficar "apenas" com dois consultórios e uma universidade em São Paulo pode ser considerado um grande negócio. "Se não conseguisse apoio, iria ter de parar com a esgrima", admite. Com o patrocínio, ele já pensa em Atenas. "O auge do esgrimista é depois dos 30 anos e pretendo chegar muito melhor na próxima Olimpíada."
Aí, então, talvez Keko não precise mais se dividir entre a tristeza e o alívio da derrota. Ao ver, uma hora depois, o duelo do seu oponente inglês contra o ucraniano Sergiy Golubytsky, campeão mundial, o esgrimista brasileiro respirou aliviado. Sem tomar conhecimento do britânico, Golubytsky fez 15 a 1 em apenas 1min25seg de disputa. "Já pensou se eu passo e eles mostram um 15 a 0 no meio da novela das oito?", imaginou Marco, já satisfeito com uma quinta parte da previsão de Wharol. Mas, em 2004, ele vai querer seu tempo restante.