Sydney - O caderno na mão recebe as jogadas anotadas que, dia-a-dia, são passadas às atletas da seleção brasileira feminina de basquete, pelo técnico "caipira" de Bauru, como se auto-intitula Antônio Carlos Barbosa. O treinador resolveu assumir totalmente o seu estilo pessoal de dirigir o time, usando a estratégia "caipira" do velho e bom bate-papo.
As idéias vão sendo transmitidas em frases de efeito, mas que se encaixam às situações, com o objetivo de trazer de volta a confiança de jogadoras que carregam o fardo de viver à sombra da dupla mais famosa que o basquete brasileiro já produziu, Paula e Hortência. E que ainda nessa Olimpíada, quatro anos depois que Hortência deixou as quadras e dois depois da despedida de Paula, voltam à cena em comparações inevitáveis.
"É um fantasma com o qual vamos ter de conviver, não tem jeito e elas têm de entender isso", afirma. "Até porque raio não cai duas vezes no mesmo lugar", completa, referindo-se ao talento da dupla brasileira.
"Era um time que juntava Paula, Hortência e Janeth, formando um trio infernal no ataque e que teve as pivôs altas para pegar rebote", vai discursando. "Melhor que isso? Só dois disso." O técnico ainda segue avaliando. "Não tem nada que vai mudar isso, nenhum trabalho psicológico altera essa situação, é natural as comparações e elas têm de compreender e assimilar isso." Tudo isso, Barbosa, vem conversando com a imprensa, sempre que pode, mas também e, principalmente, com as suas jogadoras às vésperas dos Jogos Olímpicos de Sydney.
"Como eu digo isso a elas?", pergunta. "É assim mesmo." No primeiro treino no Dome, em Sydney, onde serão realizadas as competições de basquete durante a fase de classificação, a partir de sábado, Barbosa já comemorava o que considerou a sua primeira vitória.
O time perdeu o último amistoso, antes da estréia (com a Eslováquia), para a fortíssima Austrália, mas por apenas três pontos de diferença (58 a 55), usando as reservas. O resultado, mais o comportamento de Janeth, que acertou quase 50% dos seus arremessos, aumentando muito a eficiência dos amistosos anteriores, e o ânimo do time nos treinos, fez Barbosa acreditar que as conversas estão funcionando bem.
O técnico quer que elas tentem transformar a Olimpíada em um campeonato leve. "Isso aqui é Olimpíada só até o time entrar em quadra, a partir daí é Jogos Abertos, campeonato paulista, campeonato nacional, é isso o que eu quero que elas sintam." Barbosa está mais confiante em uma boa campanha do time, que está em uma chave difícil, com Eslováquia (16), Austrália (18), Senegal (20), França (22) e Canadá (24), mas está certo que precisará contar com força máxima de suas jogadoras, especialmente as armadoras Claudinha e Adrianinha, recém-saída do juvenil.
Ele ainda não confirmou a formação oficial da equipe (com Helen, na armação, e Silvinha na lateral ou com Claudinha na armação e Helen na lateral), mas não quer as meninas preocupadas com esse detalhe.
Barbosa, que já dirigiu a seleção entre 1976 e 1984 e voltou em 1997, ainda tenta mostrar às jogadoras que elas são fruto de um universo muito pequeno e restrito da modalidade que, historicamente, só cresceu e desenvolveu-se na região do ABC e no interior de São Paulo.
Repete o que todos os especialistas apontam. O Brasil não tem quantidade e precisou de 20 anos, a partir do Mundial de 1978, para chegar com uma geração talentosa, a de Paula e Hortência, a ser campeão mundial, depois de colocações muito ruins (a melhor delas era um quinto lugar, no Mundial do Brasil, em 1982, depois do 9.º, 11.º e 10.º lugares nos outros Mundiais).