Passado de glórias, presente de dor
“Quem ousara desafiar o poderio bélico de Angkor, a mais importante civilização do sudeste asiático por quase 500 anos?”. A pergunta ficou martelando em minha cabeça desde que me deixei hipnotizar pelas fabulosas muralhas de pedra de Angkor Wat, no Camboja, como você leu no início desta reportagem. O suntuoso edifício, construído há quase 1.000 anos para ser a morada terrestre do deus hindu Vishnu, guarda, no seu interior, importantes momentos da história da civilização Khmer. Talhadas na rocha por artesãos supervisionados pelo próprio imperador, as cenas encantam pelo realismo. Umas delas retratava uma batalha, com um exército poderoso, em trajes incomuns para guerreiros khmer. “Que guerreiros eram aqueles?” eu me perguntava. A cena fazia referência às forças do Império Burmês, cuja capital, Bagan, era a única cidade do sudeste asiático a rivalizar com Angkor em suntuosidade e poderio militar. Decidido a conhecer mais profundamente aquela cultura, parti rumo à Mianmá. O país é (mal) governado por uma ridícula junta militar. A bem da verdade, desde a independência, em 1947, a instabilidade política tomou conta do país. Em 1962, um golpe de estado liderado pelo General Ne Win provocou o exílio de diversos líderes políticos e a morte de milhares de opositores. Por meio da força bruta, o General Ne Win implantou o “Caminho Burmês para o Socialismo”, realizando uma incrível desapropriação dos bens privados, de grandes fábricas a pequenos pontos de comércio. Ao final da década de 80, a pressão popular era tamanha que os militares foram obrigados a fazer algumas concessões. Em 1990, uma eleição multipartidária trouxe certa euforia ao país, resultando numa vitória expressiva do principal partido de oposição, liderado por Aung San Suu Kyi, filha do popular líder U Aung San, um dos responsáveis pela independência de Burma. A junta militar, só para variar, meteu os pés pelas mãos e se recusou a entregar o poder aos seus legítimos donos. Como se isso não bastasse, aprisionou Aung San Suu Kyi em sua residência, provocando inúmeros protestos internacionais. Em 1991, a líder da oposição recebeu o Prêmio Nobel da Paz, fato que intensificou as críticas mundiais ao governo burmês.
Henry Daniel Ajl
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